TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

204 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL c) na verdade, através da imposição de uma taxa, podem prosseguir-se finalidades de interesse público con- ducentes a um montante diverso do correspondente a tal valor ou custo, correspondendo, ainda, nesta hipótese, ao pagamento da taxa, a contraprestação de um bem ou serviço por parte do Estado; d) apenas a manifesta desproporcionalidade entre o montante do tributo, por essa forma determinado, e o custo do serviço público (o carácter «completamente alheio» a este), poderá levar a que o tributo em ques- tão deva ser encarado, de um ponto de vista jurídico-constitucional, como verdadeiro imposto, uma vez que, desse modo, e nessa medida, se afetaria a sua correspetividade; e) no que respeita à “taxa de justiça”, o Tribunal Constitucional tem considerado que se trata de uma verda- deira taxa e não de um imposto, encontrando-se, na sua origem, a prestação do serviço de administração da justiça, que apenas pode ser prestado pelo Estado (dado o monopólio público do uso da força); f ) o legislador nacional dispõe, porém, de uma larga margem de liberdade de conformação em matéria de definição do montante das taxas de justiça; g) essa liberdade não implica, todavia, que as normas definidoras dos critérios de cálculo sejam imunes a um controlo de constitucionalidade, quer no que toca à sua aferição segundo regras de proporcionalidade, decorrentes do princípio do Estado de Direito (artigo 2.º da Constituição), quer no que respeita à sua apreciação à luz da tutela constitucional do direito de acesso à justiça (artigo 20.º da Constituição); h) a fixação das custas, em proporção direta ao valor da causa, sem qualquer limite máximo, pode conduzir a situações em que tal taxa se revele manifestamente desproporcionada ao custo do serviço ou à utilidade tirada do meio judicial empregue, pelo que ficará posta em causa a relação de correspondência entre o serviço e o tributo, o qual, assim, dificilmente poderá ser qualificado como verdadeira taxa; i) o que está em causa, nesta dimensão normativa, não é tanto – ou não é apenas – a bondade constitucional do critério elegido para a fixação das custas em função do valor da causa, mas, tendo em conta os demais elementos do critério de tributação, ou seja, os concretos escalões quantitativos fixados e o modo como operam, a ausência de qualquer limite máximo para o valor da causa, e, consequentemente, para os resul- tados da aplicação daquele critério na determinação do valor da tributação em custas, independentemente da complexidade do processo, ou, mesmo, da sua concreta e efetiva utilidade para o recorrente; j) por outras palavras, a aplicação de um tal critério poderá conduzir a que, a partir de um certo limite, não possa o montante de taxa devida encontrar justificação seja no princípio da equivalência, seja no princípio da cobertura de custos; l) ora, havendo uma “desproporção intolerável” entre “o montante do tributo e o custo do serviço prestado”, justamente por ser manifestamente exorbitante o valor calculado em função da mesma norma, ocorrerá também uma violação evidente do direito de acesso ao direito e aos tribunais; m) o direito de acesso aos tribunais não compreende um direito a litigar gratuitamente, pois não existe um princípio constitucional de gratuitidade no acesso à justiça, podendo, pois, o legislador fixar o montante das custas com grande liberdade e exigir o respetivo pagamento sem que, com isso, esteja necessariamente a restringir o direito de acesso aos tribunais; n) essa liberdade constitutiva do legislador tem, no entanto, um limite – limite, esse, que é o de a justiça ser realmente acessível à generalidade dos cidadãos, sem terem que recorrer ao sistema de apoio judiciário; o) ou seja, assegurar a garantia do acesso aos tribunais, subentende uma programação racional e constitucio- nalmente adequada dos custos da justiça, não podendo o legislador adotar soluções, de tal modo onerosas, que impeçam o cidadão médio de aceder à justiça; p) nessa medida, quando o valor da causa se revele manifestamente excessivo e desproporcionado, por as custas judiciais serem fixadas em proporção ao valor da causa, sem qualquer limite máximo ao respetivo montante, estar-se-á perante uma situação de inconstitucionalidade material, por violação do direito de acesso aos tribunais, conjugado com o princípio da proporcionalidade, na medida em que tal norma não permite, ao tribunal, limitar o montante de taxa de justiça devido no caso concreto, tendo em conta,

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=