TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

215 acórdão n.º 656/14 Regulamento das Custas Processuais anotado , cit., p. 195), podendo, nestes casos, o juiz determinar a aplicação de valores agravados de taxa de justiça. Como se deixava também explicitado no diploma preambular, tendo-se constatado que «o valor da ação não é um elemento decisivo na ponderação da complexidade do processo e na geração de custos para o sistema judicial», procurou-se «um aperfeiçoamento da correspetividade da taxa de justiça», estabelecendo-se «um sistema misto que assenta no valor da ação, até um certo limite máximo, e na possibilidade de correção da taxa de justiça quando se trate de processos especialmente complexos, independentemente do valor eco- nómico atribuído à causa». 12. Ora, de acordo com o regime pretérito que decorria do já acima citado artigo 34.º, n.º 1, alínea b) , e n.º 2, do Código das Custas Judiciais, em conjugação com a Portaria n.º 1178-D/2000, de 15 de dezembro, quando a perícia implicasse mais do que um dia de trabalho, na fixação da remuneração do perito, o juiz, partindo embora da informação prestada pelo autor da perícia, podia reduzir ou ampliar o número de dias de trabalho indicado pelo perito, consoante entendesse, por um lado, que a perícia podia ter sido feita em menos tempo ou, por outro, que a dificuldade, qualidade e relevo do serviço o justificasse. Desta faculdade concedida ao juiz decorria a possibilidade de ajustamento da remuneração do perito em função do grau de dificuldade exigido, tempo despendido, ou mesmo a qualidade do serviço prestado. O Regulamento das Custas Processuais, na versão aplicada na decisão recorrida, não prevê, contudo, idêntica faculdade, antes impõe um limite máximo inultrapassável no valor de € 1020 na remuneração a fixar a cada perito. E é precisamente na fixação normativa deste limite que reside a questão de constituciona- lidade a apreciar no presente recurso. 13. Nos termos do n.º 4 do artigo 17.º do Regulamento das Custas Processuais, «a remuneração é fixada em função do valor indicado pelo prestador do serviço, desde que se contenha dentro dos limites impostos na tabela IV» [à qual acrescem as despesas de transporte que se justifiquem nos termos do aditamento introdu- zido na parte final daquele normativo pela Lei n.º 7/2012]. Trata-se, assim, de «um normativo que privilegia razoavelmente a indicação do preço respetivo por quem presta o serviço de colaboração com a administração da justiça, no âmbito dos vários processos, nos diversos tribunais, mas a referida indicação não releva se não for conforme com os valores máximos a que se reporta a tabela IV» (Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais anotado, cit., p. 291). O juiz pode, então, aumentar ou diminuir a remuneração pedida pelo perito como compensação do serviço prestado, em função da complexidade da atividade desenvolvida, desde que não ultrapasse o valor máximo constante da tabela IV ( € 1020). O tribunal a quo desaplicou o preceito em causa por violação dos artigos 2.º, 18.º, n.º 2, 20.º, n. os 1 e 4, e 59.º, n.º 1, alínea a) , da Constituição. Como já se referiu, a decisão recorrida parte da conceção da dignidade da pessoa humana como valor fundamental da Constituição Portuguesa e do facto de o direito à retribuição dos trabalhadores ter «natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias (cfr. Artigo 17.º da Constituição)», para concluir que o limite legal do artigo 17.º do Regulamento das Custas Processuais «integra uma norma materialmente inconstitucional porque viola o princípio constitucional da retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, conforme Artigo 59.º, n.º 1, alínea a) da Consti- tuição». No entendimento do juiz a quo, «não é aceitável num Estado de direito assente sobre o conceito da dignidade da pessoa humana a manutenção de uma norma que permita a realização de trabalho sem que o trabalhador veja remunerado o seu esforço». Para além disso, a decisão recorrida considera, de seguida, que «o limite absoluto à remuneração dos peritos contende com o direito à produção efetiva de prova pelas partes na medida em que não assegura que a perícia seja realizada por perito qualificado, que analise a situação de forma cabal, competente e esclarecedora para o tribunal». É entendimento do juiz a quo que «a operância de tal limite conduz à degradação da qua- lidade da prestação dos peritos», o que coloca em causa, igualmente, «a garantia de um processo equitativo

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