TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

223 acórdão n.º 658/14 Artigo 382.º 2. O procedimento é inválido se: (…) c) Não tiver sido respeitado o direito do trabalhador a consultar o processo ou a responder à nota de culpa ou, ainda, o prazo para resposta à nota de culpa». Note-se que a articulação entre as duas normas faz sentido no caso concreto, na medida em que a comprovação da justa causa de despedimento exige a prévia instauração de procedimento disciplinar, nos termos legalmente adequados. Assim, uma invalidade do procedimento disciplinar – no caso de este visar o despedimento com justa causa – acarretaria a ilegalidade do despedimento. 4. O direito de consulta do processo disciplinar laboral por parte do trabalhador arguido não constitui novidade do atual direito do trabalho português. Anteriormente ao Código do Trabalho vigente, o n.º 4.º do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de dezembro (conhecido como Lei da Cessação do Contrato de Trabalho, acrónimo LCCT) impunha ao empregador o ónus de facultar ao arguido a consulta do processo. Note-se que, anteriormente, a Lei do Contrato de Trabalho (LCT, constante Decreto-Lei n.º 49408, de 24 de novembro de 1969), no n.º 3 do seu artigo 31.º, não mencionava especificamente a consulta do processo disciplinar, limitando-se a exigir a audiência prévia do trabalhador. De todo o modo, a consulta do processo sempre foi considerada um ins- trumento do direito de defesa do trabalhador arguido, sem o que esta não poderia ser realmente assegurada. Não é difícil compreender porquê: para além da obrigação de remeter ao trabalhador arguido nota de culpa – identificando, localizando no tempo e no espaço, descrevendo e valorando os comportamentos alega- damente integrantes da infração disciplinar –, a consulta do processo, rectius , a possibilidade de a ela proce- der, são fundamentais para o exercício do direito de defesa, condicionando decisivamente a efetividade desta. Mas, claro, uma coisa é o dever de possibilitar, ou não embaraçar, a consulta do processo disciplinar pelo trabalhador arguido e outra, bem distinta, a obrigação de notificar este, juntamente com a nota de culpa, das condições e do local de consulta do processo disciplinar. 5. Isto mesmo foi reconhecido no aresto do Supremo Tribunal de Justiça mais referido nesta matéria, o acórdão de 4 de fevereiro de 2004 (Processo n.º 03S3946, disponível na base de dados do ITIJ). A jurisprudência emergente deste acórdão, na parte que ao caso releva, acentua os seguintes aspetos: A consulta do processo constitui «uma formalidade procedimental que se destina a assegurar o exercício do direito de audiência e defesa do trabalhador»; Ocorre preterição deste direito quando o arguido «fica impossibilitado de aceder ao processo discipli- nar»; A lei não impõe a notificação ao arguido das «condições e local de consulta do processo disciplinar» (a lei aqui referida é o artigo 10.º da LCCT). 6. Em anotação a este Acórdão, publicada na Revista de Direito e Estudos Sociais (RDES), janeiro – setembro 2004, pp. 197 e segs.), António Monteiro Fernandes, começa por acentuar que «mesmo quando as peças fundamentais do processo, que são a nota de culpa e a comunicação da intenção de despedir, revelam insuficiências de conteúdo ou defeitos formais, o que é decisivo é que o trabalhador mostre ter consciência da acusação e das possíveis consequências disciplinares. Com isso se basta a viabilidade do exercício do direito de resposta ou de defesa do trabalhador» (itálico do autor). Esclarece depois a sua compreensão relativamente à consulta do processo: «a faculdade de consulta do processo é um elemento acessório, instrumental, no complexo das condições que podem contribuir para o reforço da posição defensiva do arguido (…) mas não um elemento estruturante do direito de defesa». E con- clui: se a lei quisesse «impor um comportamento ativo ao empregador no sentido de proporcionar ao arguido

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