TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

266 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL II – Fundamentação O Ministério Público, nas suas alegações, sustentou existir falta de interesse processual na apreciação da questão de constitucionalidade invocada na decisão impugnada, resultante da inexistência de uma efetiva desaplicação da norma ínsita na alínea e) do n.º 1 do artigo 449.º do Código de Processo Penal. Segundo refere o Ministério Público nas mencionadas alegações, a decisão recorrida pronunciou-se sobre um requerimento de interposição de recurso extraordinário de revisão de sentença, subscrito exclusi- vamente pelo arguido, sem participação de defensor, constituído ou nomeado oficiosamente, em desrespeito do exigido pelo artigo 64.º, n.º 1, alínea e) , do Código de Processo Penal (que determina a obrigatoriedade da assistência do defensor nos recursos ordinários ou extraordinários). Ainda de acordo com o alegado pelo Ministério Público, a decisão recorrida, embora teça diversas considerações sobre a conformidade constitu- cional da norma contida no artigo 449.º, n.º 1, alínea e) , do Código de Processo Penal, no segmento decisó- rio, acaba por rejeitar o recurso não só por força da recusa de aplicação da aludida norma com fundamento em inconstitucionalidade, mas igualmente “(…) por o recorrente não reunir as condições necessárias para recorrer”. Conclui, assim, o Ministério Público que, uma vez que o recurso de fiscalização concreta da consti- tucionalidade tem um caráter instrumental, existindo um fundamento alternativo de rejeição do recurso extraordinário, carece de utilidade a decisão sobre o presente recurso. Conforme refere o Ministério Público nas suas alegações, a decisão recorrida, na sua fundamentação, tece diversas considerações sobre a inconstitucionalidade de uma determinada interpretação normativa da alínea e) do n.º 1 do artigo 449.º do Código de Processo Penal, que recusa aplicar aos autos, por entender que a mesma é inconstitucional. Contudo, em momento algum dessa fundamentação é feita qualquer referência ao disposto no artigo 64.º, n.º 1, alínea e) , do Código de Processo Penal e à circunstância de o Arguido não estar assistido por defensor na interposição do recurso em causa. Face a isso, não se poderá concluir, apenas pelo que consta do segmento decisório, que o recurso foi rejeitado, não só por força da recusa de aplicação, com fundamento em inconstitucionalidade, da referida interpretação do artigo 449.º, n.º 1, alínea e) , do Código de Processo Penal, ao abrigo da qual o recurso era interposto, mas igualmente por o recorrente não reunir as condições necessárias para recorrer devido a não estar assistido por defensor. Ou seja, a referência, no segmento decisório, ao facto de o recorrente não reunir as condições necessárias para recorrer tem como fundamento apenas o facto de ter sido recusada a aplicação da interpretação norma- tiva do artigo 449.º, n.º 1, alínea e) , do Código de Processo Penal e, dessa forma, não existir o pressuposto de admissibilidade ao abrigo do qual o recurso extraordinário de revisão havia sido interposto. Face ao exposto, não se poderá concluir pela falta de utilidade do presente recurso, resultante da existên- cia de um fundamento alternativo para rejeição do recurso extraordinário de revisão de sentença. Contudo, verifica-se que o tribunal recorrido fundamentou a decisão de rejeição do recurso de revisão na recusa de aplicação, por inconstitucionalidade, do disposto no artigo do artigo 449.º, n.º 1, alínea e) , do Código de Processo Penal, interpretado no sentido de que «as provas proibidas cuja nulidade é sanável, nos termos gerais dos artigos 120.º, 121.º, 123.º e 126.º, n.º 3, do Código de Processo Penal podem ser invo- cadas em qualquer momento posterior ao trânsito em julgado da sentença, sem necessidade de outra que, também transitada em julgado, tenha taxado essas provas de proibidas e inválidas». Ora, o recurso de revisão em causa tinha como fundamento a alegação de que a condenação do recor- rente se havia baseado em prova obtida mediante tortura e coação, isto é, em prova proibida pelo artigo 126.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, cuja invalidade não é sanável, pelo que a interpretação recusada é insuscetível de fundamentar a decisão recorrida. Nestas situações em que, apesar de no discurso da decisão recorrida a recusa de determinada norma manifestamente não aplicável ao caso sub iudice é apresentada como seu fundamento, uma vez que a inter- venção do Tribunal Constitucional ocorre em fase anterior à intervenção dos tribunais de recurso de ordem

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