TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

297 acórdão n.º 695/14 É esta vinculação do sistema fiscal à ideia de justiça social e à diminuição da desigualdade na distribuição social dos rendimentos e da riqueza que exige que o mesmo seja progressivo. Essa exigência está expressa- mente consagrada no âmbito da tributação do rendimento pessoal: de acordo com o n.º 1 do artigo 104.º, o imposto sobre o rendimento pessoal visa «a diminuição das desigualdades e será único e progressivo, tendo em conta as necessidades e os rendimentos do agregado familiar». A progressividade fiscal requer que a relação entre o imposto pago e o nível de rendimentos seja mais do que proporcional, o que só pode alcançar-se aplicando aos contribuintes com maiores rendimentos uma taxa de imposto superior. Por outras palavras, há progressividade quando o valor do imposto aumenta em proporção superior ao incremento da matéria coletável. Em todo o caso, a progressividade é um conceito indeterminado, suscetível de graus muito diversifica- dos de concretização. E não é possível inferir do imperativo constitucional o grau de amplitude que, em con- creto. permita satisfazer o requisito de progressividade exigível. A Constituição portuguesa não se pronuncia sobre o número de escalões nem sobre a grandeza das taxas respetivas, questões que são deixadas à margem de apreciação político-legislativa. O grau de progressividade, assim como o nível de tributação, a carga fiscal ou a relação entre os diferentes impostos são questões de “política fiscal” que é, ela própria, um instrumento de política governamental (neste sentido, Gomes Canotilho/Vital Moreira, ob. cit. , p. 1102). A progressividade encontra-se, no entanto, expressamente consagrada e existem referências valorativas que permitem concluir que esse elemento conformador do imposto sobre o rendimento pessoal é estabele- cido como forma de cumprimento da tarefa que cabe ao sistema fiscal, no seu conjunto, de promover uma justa repartição dos rendimentos e da riqueza. Consequentemente, a Constituição exige uma progressividade com a virtualidade intrínseca de contribuir para uma diminuição da desigualdade de rendimentos (sobre todos estes aspetos, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 187/13, n. os 97, 98 e 99). 5. A progressividade do sistema fiscal constitui também uma exigência do princípio da igualdade material. Conforme refere Casalta Nabais, o princípio da igualdade fiscal tem ínsita sobretudo «a ideia de genera- lidade ou universalidade, nos termos da qual todos os cidadãos se encontram adstritos ao cumprimento do dever de pagar impostos, e da uniformidade, a exigir que semelhante dever seja aferido por um mesmo cri- tério – o critério da capacidade contributiva. Este implica assim igual imposto para os que dispõem de igual capacidade contributiva (igualdade horizontal) e diferente imposto (em termos qualitativos ou quantitativos) para os que dispõem de diferente capacidade contributiva na proporção desta diferença (igualdade vertical)» ( Direito Fiscal, 5.ª edição, Coimbra, 2009, pp. 151-152). Configurando-se o princípio geral da igualdade como uma igualdade material, o princípio da capaci- dade contributiva – segundo o mesmo autor – enquanto tertium comparationis da igualdade no domínio dos impostos, não carece dum específico e direto preceito constitucional. O seu fundamento constitucional é o princípio da igualdade articulado com os demais princípios e preceitos da respetiva “constituição fiscal” e, em especial, aqueles que decorrem já dos princípios estruturantes do sistema fiscal que constam dos artigos 103.º e 104.º da Constituição ( ob. cit. , p. 152). Como pressuposto e critério da tributação, o princípio da capacidade contributiva – dentro da mesma linha de entendimento – «afasta o legislador fiscal do arbítrio, obrigando-o a que na seleção e articulação dos factos tributários, se atenha a revelações da capacidade contributiva, ou seja, erija em objeto e matéria coletável de cada imposto um determinado pressuposto económico que seja manifestação dessa capacidade e esteja presente nas diversas hipóteses legais do respetivo imposto» ( ob. cit. , p. 154). Também o Tribunal Constitucional, mais recentemente, tem analisado o princípio da igualdade fiscal sob o prisma da capacidade contributiva, como se pode constatar designadamente no Acórdão n.º 142/04 (que reproduziu em parte o que já se afirmara no Acórdão n.º 452/03), onde se consigna que «[o] princípio da capacidade contributiva exprime e concretiza o princípio da igualdade fiscal ou tributária na sua vertente de ‘uniformidade’ – o dever de todos pagarem impostos segundo o mesmo critério – preenchendo a capaci- dade contributiva o critério unitário da tributação», entendendo-se esse critério como sendo aquele em que

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