TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

314 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Ministério Público. Ou seja, se o ofendido reagir contra a decisão de arquivamento do inquérito respeitando rigo- rosamente as regras e os critérios legais, o resultado pode ser a impossibilidade de confrontar judicialmente essa decisão. É de tal modo evidente que tal entendimento leva a resultados iníquos que não se vê como negar que tal inter- pretação dos preceitos legais em causa viola, frontalmente, a garantia constitucional de tutela jurisdicional efetiva consagrada no artigo 20.º. n. º 1, da CRP. […] Como anotam J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira ( Constituição da República Portuguesa Anotada , vol. I, Coimbra Editora, 4.ª edição revista, 415), “o significado básico da exigência de um processo equitativo é o da conformação do processo de forma materialmente adequada a uma tutela judicial efetiva”. Ora, aquela interpretação (que tem prevalecido na jurisprudência) não tutela o legítimo interesse do ofendido/ assistente na submissão a julgamento e na condenação daquele que praticou um crime que o afetou, pois conduz a que um inquérito possa ser encerrado pelo Ministério Público sem que o interessado possa submeter a sindicância judicial o despacho de arquivamento.» Em primeiro lugar, importa salientar que, não obstante a interpretação normativa em causa nos pre- sentes autos ter uma formulação diferente da que foi apreciada nos recursos a que respeitam os Acórdãos n. os  501/05 e 539/05, a questão de constitucionalidade é substancialmente idêntica nas três situações. Em qualquer delas, o que está em causa é a conformidade constitucional do entendimento segundo o qual, no caso de o assistente ou denunciante com a faculdade de se constituir assistente optar por reclamar hierarquicamente do despacho de arquivamento proferido pelo titular do inquérito, fica impedido de poste- riormente deduzir um pedido de abertura de instrução, seja porque, com o acionamento da reclamação hie- rárquica precludiu ou verificou-se uma renúncia tácita ao direito de requerer a abertura de instrução, como ocorre com a interpretação normativa sub iudice , seja porque o prazo exigido para o exercício desse direito se esgota durante a efetivação do controle hierárquico, como sucede com as interpretações normativas julgadas não inconstitucionais pelos Acórdãos n. os  501/05 e 539/05. No Acórdão n.º 501/05 escreveu-se o seguinte a esse respeito: «[…] No presente recurso não se põe em crise a razoabilidade do prazo de 20 dias para o assistente requerer a abertura da instrução, isto é, a suficiência ou a adequação desse lapso de tempo para a tarefa processual que a apresentação do requerimento implica. Também não se discute a idoneidade da notificação prevista nos n. os 3 e 4 do artigo 277.º do Código de Processo Penal, enquanto ato de comunicação, para habilitar o interessado com o conhecimento de que pode exercer a referida faculdade. O que a recorrente questiona é a conformidade constitucional de a essa notificação continuar a ligar-se o efeito de definir o termo inicial do prazo para requerer a instrução naqueles casos em que o interessado tenha optado por provocar a intervenção da estrutura hierárquica do Ministério Público. Ou seja, aquilo que, em último termo, está subjacente à pretensão da recorrente de diferir o termo inicial do prazo para a notificação da decisão confirmativa do despacho de arquivamento é o entendimento de que a proteção constitucional da posição do ofendido em processo penal exige o reconhecimento da faculdade de optar pela via da impugnação hierárquica do despacho de arquivamento proferido pelo titular do inquérito previamente a requerer a abertura da instrução e sem perda do prazo respetivo. Ora, independentemente de saber se a consagração constitucional da intervenção do ofendido em processo penal impunha (como condição necessária) que se levasse a preocupação de lhe conferir voz autónoma logo ao nível da conformação do objeto do processo até ao ponto de lhe ser permitido acusar independentemente (contra ou substancialmente para além) do Ministério Público por crimes públicos (a isso equivale o requerimento de abertura da instrução que venha a culminar na pronúncia do arguido), o que não parece poder negar-se é que tal faculdade realiza a tutela judicial dos seus interesses de modo suficiente e efetivo. Porventura, seria mais cómodo e mais económico para o ofendido que a lei lhe permitisse diferir o início do prazo de apresentação do requerimento

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