TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

315 acórdão n.º 713/14 para o momento em que se verificasse o insucesso da via hierárquica. Mas, uma vez que o exercício desse direito não está condicionado ao prévio esgotamento (necessário) da via hierárquica, o entendimento de que o prazo para requerer a abertura da instrução se inicia com a notificação do despacho do magistrado subalterno que decide pelo arquivamento do inquérito não pode ser apresentado como restringindo, e muito menos de modo desproporcio- nado, a tutela judicial dos interesses do ofendido pela via da perseguição criminal do pretenso ofensor. Dificilmente se concebe que uma norma que imediatamente abre o prazo para acesso ao tribunal possa ser acusada de, só por isso, restringir esse acesso. Por último, para além do que já vai compreendido no que antecede, também se não vislumbra em que aspeto pode ser imputada à referida regra de determinação do termo inicial do prazo desconformidade com a exigência constitucional do “processo equitativo”.» No caso dos autos, o recorrente entende que a interpretação normativa aplicada pela decisão recorrida viola a garantia constitucional da tutela jurisdicional efetiva consagrada no artigo 20.º, n.º 1, da Consti- tuição, uma vez que se o imediato superior hierárquico do autor do despacho de arquivamento desatender a reclamação, confirmando o despacho de arquivamento, o denunciante não pode requerer a abertura de instrução, pois, ao suscitar a intervenção hierárquica, renuncia ao controlo judicial da decisão do Ministério Público. É o n.º 7 do artigo 32.º da Constituição, que assegura especificamente a participação dos ofendidos no processo penal. Esta norma não especifica, porém, o conteúdo desse direito de participação, remetendo para o legislador ordinário tal tarefa. OTribunal Constitucional tem sustentado que a lei processual penal não pode privar o ofendido daque- les poderes processuais que se revelem necessários à defesa dos seus interesses, restringindo o direito de intervenção do ofendido de forma desadequada, desnecessária ou arbitrária ( v. g. o Acórdão n.º 338/06, em www.tribunalconstitucional.pt ), sujeitando, assim, a um juízo de proporcionalidade as limitações que sejam impostas à intervenção da vítima no processo penal. A solução normativa sindicada não deixa de garantir ao denunciante com a possibilidade de se constituir assistente a faculdade de requerer a abertura da instrução perante o despacho de arquivamento proferido pelo titular do inquérito, estando aberta, desta forma, uma via do controlo jurisdicional da decisão do Ministério Público. O que ela não permite é que, tendo aquele optado pela reclamação hierárquica do despacho de arquivamento, a via jurisdicional permaneça aberta para ser acionada posteriormente, em caso de malogro da reclamação deduzida. A questão que se coloca é, pois, a de saber se esta limitação ao direito de participação do ofendido no processo penal é desproporcionada. A solução interpretativa adotada tem um fundamento racionalmente inteligível, uma vez que atende a outros valores constitucionais que têm de ser salvaguardados, designadamente os direitos de defesa dos even- tuais suspeitos ou arguidos, que veem tanto mais prolongada a sua situação processual, quanto mais perdurar no tempo a possibilidade de a decisão de arquivamento do inquérito puder ser alterada. No sentido da prevalência dos direitos de defesa dos eventuais suspeitos ou arguidos sobre o direito dos ofendidos requererem a instrução já se pronunciou o Acórdão n.º 27/01 deste Tribunal (acessível em www.tribunalconstitucional.pt ), onde se referiu o seguinte: «[…] Ora, nos casos de não pronúncia de arguido e em que o Ministério Público se decidiu pelo arquivamento do inquérito, o direito de requerer a instrução que é reconhecido ao assistente – e que deve revestir a forma de uma verdadeira acusação – não pode deixar de contender com o direito de defesa do eventual acusado ou arguido no caso daquele não respeitar o prazo fixado na lei para a sua apresentação. […]

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