TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

336 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL X. O entendimento legal, tradicional e enraizado do arresto preventivo no direito português é de que, ou o mesmo tem lugar depois de a caução ter sido fixada e não ter sido prestada – e, neste caso o arguido já foi ouvido –, ou o arresto tem lugar antes de a caução ter sido fixada, e neste caso o requerido não deve ser ouvido, pois só o sigilo da providencia protege o interesse do requerente do arresto preventivo. XI. O arresto é decretado, por definição legal, sem audição do Requerido, conforme expressamente estatui o artigo 393.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, para o qual o artigo. 228.º do CPP se limita a remeter. XII. Aliás, o n.º 3 do artigo 228.º do CPP é claro ao estatuir que o exercício do contraditório no arresto preven- tivo é feito pela oposição ao despacho que tiver decretado o arresto, ou seja, apenas depois do seu decreta- mento. XIII. A necessidade de eficácia da providência cautelar de arresto não se compadece com a prévia audição do arguido, sendo tal entendimento comum aos Processos Civil e Penal. XIV. O recorrente, em momento imediatamente anterior ao decretamento do Arresto, preparava-se para alienar uma coleção de 74 carros clássicos da marca Mercedes-Benz, os quais tinham sido já enviados para o estran- geiro, e a maioria dos veículos não tinha um preço de venda mínimo estabelecido, pelo que a verificação dos requisitos legais exigidos são absolutamente claros e, por outro lado a necessidade de não audição do Arguido indispensável para a eficácia e utilidade da providência. XV. Entender que o arresto preventivo é precedido de audiência do arguido é, em toda a linha, violentar o regi- me e o propósito da providência cautelar de arresto, esvaziando-o de conteúdo, tornando-o uma inutilidade jurídica, razão pela qual o artigo 228.º, n.º 1, do CPP, é claro ao estabelecer, tout court, que “pode o juiz decretar o arresto nos termos da lei do processo civil”. XVI. O prévio contraditório e a consequente atribuição do prazo de 10 dias para o Arguido se opor, querendo, teria como consequência inelutável que o eventual decretamento da providência só pudesse ocorrer após a dissipação ou ocultação definitiva de património que precisamente se pretendia evitar. XVII. Diga-se, aliás, que não obsta sequer ao decretamento do Arresto o facto de o Denunciado ainda não ter sido constituído Arguido, pelo que não pode relevar o facto de o Arguido apenas se encontrar sujeito a Termo de Identidade e Residência no momento em que foi decretado o arresto. XVIII. O regime do arresto preventivo é definido por remissão, pura e simples para a lei civil ( ex vi 228.º, n.º 1 do CPP), pelo que não assiste ao Arguido qualquer direito a acrescer àqueles que são conferidos ao Requerido em Processo Civil. XIX. A não audição prévia do arguido não significa, de forma alguma, a supressão do contraditório, uma vez que o Arresto é decretado sem audiência prévia do Arguido, mas após a notificação da notificação do despacho que o decreta o Arguido vê abrirem-se várias formas de controlo da decisão proferida, nomeadamente a oposição e o recurso do despacho que o decretou – cfr. artigo 228.º, n.º 3, do CPP. XX. O contraditório deve funcionalmente, por regra, anteceder a decisão. Mas há situações em que o contraditó- rio pode não anteceder a decisão e se deve admiti-lo apenas diferidamente nos casos em que a tutela efetiva e eficaz que o processo deve propiciar tem sério risco de ficar inviabilizada no caso de ser ouvida a parte contra quem essa pretensão é formulada. XXI. A solução para mediar o suposto conflito terá de passar pela aplicação do princípio da proporcionalidade, nos termos do artigo 18.º, n.º 2, da CRP. Nestes casos, dentro dos quais figura sem reserva de dúvida o preceito de cuja constitucionalidade se cogita, há que dar preferência à possibilidade de realização material do direito que o requerente visiona com o seu recurso ao tribunal. XXII. O contraditório não é abolido, sendo apenas diferido para depois da decisão, dando-se então ao requerido a oportunidade de contraditar não só a alegação dos fundamentos feita pelo requerente, mas igualmente a prova feita sobre eles. XXIII. A circunstância de ser diferido o contraditório para a fase posterior à notificação do despacho que decreta o arresto está dependente da demonstração probatória da existência dos requisitos legais a que está subordi- nado o procedimento cautelar em causa (art. os 388.º e 389.º do CPC,) o que não deixa de constituir uma garantia de que a restrição à regra geral do princípio do contraditório, traduzida no contraditório diferido,

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