TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

348 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Como se vê, é por entender, na esteira da jurisprudência de que se socorre, que «sendo o arresto pre- ventivo decretado nos termos da lei civil, não se vê por que razão há-de, neste particular, divergir do artigo 408.º, n.º 1, do CPC» (fls. 2677), que o Tribunal conclui pela aplicabilidade do regime do arresto preventivo do Código de Processo Civil, não considerando assim verificada a invocada nulidade insanável [artigo 119.º, alínea c), do CPP] da sentença de primeira instância que decretou o arresto sem prévia audição do arguido. Ora, não compete ao Tribunal Constitucional sindicar a interpretação perfilhada à luz do artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil, de modo a censurar a alegada desconsideração da presunção que «o legislador con- sagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados» relativamente à aplicabilidade (ou não) ao caso das invocadas normas dos artigos 191.º e 194.º do CPP. Essa é matéria de direito comum, para a qual são competentes os tribunais comuns. À jurisdição constitucional cabe antes o controlo da conformidade constitucional de normas. Constituindo o objeto do recurso de constitucionalidade a interpretação normativa, que se impõe como um dado a este Tribunal, enunciada no requerimento de interposição de recurso apresentado pelo recorrente e efetivamente aplicada pelo tribunal a quo – e não o resultado que o recorrente entende dela decorrer – a desconsideração e não aplicação dos artigos 191.º e 194.º do CPP (na falta de norma expressa no artigo 228.º do CPP que afaste ou derrogue aquelas disposições gerais em matéria de medidas de coação e de garan- tia patrimonial) – não pode relevar como parâmetro, independentemente da sua qualificação como norma materialmente constitucional, o artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil. Deste modo, não cumpre apreciar a bondade da interpretação perfilhada na decisão recorrida, mas sim aferir da constitucionalidade dessa interpretação normativa – ora impugnada – que constitui o objeto do presente recurso por referência aos demais parâmetros constitucionais invocados – os n. os 1, 5 e 2 do artigo 32.º e o artigo 13.º da Constituição. Vejamos, pois. 17. Deve começar-se por salientar que o regime contido na lei processual civil quanto ao decretamento da providência cautelar de arresto sem prévia audição do arrestado foi já objeto de escrutínio constitucional. Aliás, o próprio acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa recorrido socorre-se, em grande medida, da juris- prudência expendida no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 303/03 (disponível, como os demais cita- dos, em www.tribunalconstitucional.pt ), q ue apreciou a constitucionalidade da norma constante do 404.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (na redacção então vigente), onde se dispunha que examinadas as provas produzidas, o arresto será decretado, sem audiência da parte contrária, desde que se mostrem preenchidos os requisitos legais (…). Diga-se, desde já, que se acompanha o entendimento do acórdão do Tribunal Constitucional citado – em consonância aliás com a orientação jurisprudencial já seguida no Acórdão n.º 163/01 –, não merecendo censura constitucional o regime normativo do arresto preventivo, ao não prever a audição prévia do reque- rido para o decretamento da providência cautelar em causa (regime hoje reproduzido no artigo 393.º do novo Código de Processo Civil, que prevê, no seu n.º 1, o decretamento do arresto «sem audiência da parte contrária, desde que se mostrem preenchidos os requisitos legais»). Afigura-se que a solução normativa contida na lei processual civil encontra justificação na natureza dessa mesma medida cautelar, cujas finalidades específicas se mostrariam desvirtuadas com a prévia audição do arrestado. Com efeito, e tal como suficientemente desenvolvido na jurisprudência constitucional citada, o dife- rimento do exercício do contraditório do momento prévio à decisão para fase ulterior mostra-se justificado pelo sério risco de inviabilização da medida cautelar a adotar (por via da alienação ou dissipação dos bens a arrestar), sendo «o direito a uma efectiva e eficaz tutela da pretensão do demandante só assegurável, em termos de razoabilidade, se o requerido não for antes ouvido».  Ora, nos termos da lei processual civil, o arresto (preventivo) constitui uma providência cautelar ex parte, de finalidade tipicamente conservatória, que procura salvaguardar a situação (patrimonial) existente,

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