TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

349 acórdão n.º 724/14 evitando alterações prejudiciais aos direitos dos demandantes ( in casu , a ora recorrida), determinada por razões de urgência e celeridade e cujo efeito útil seria frustrado com a prévia participação do demandado. Deste modo, provada a existência provável de um crédito e o receio justificado da perda da garantia patri- monial (ou seja, verificados os pressupostos de aplicação da medida cautelar em causa), pode ser decretada a apreensão judicial de bens sem prévia audição do requerido, sob pena de a medida cautelar ser esvaziada do seu efeito útil. Depois, e como também assinalado no aresto acima transcrito, o contraditório é ainda assegurado, «sendo apenas diferido para depois da decisão», podendo acompanhar-se a jurisprudência constitucional citada quando conclui que os meios de impugnação facultados pelo legislador – como a dedução de embar- gos (ao arresto) ou o recurso judicial – e, bem assim, as demais garantias associadas à decisão (como as exi- gências de fundamentação) amplamente contribuem para afastar um juízo de inconstitucionalidade a este propósito. 18. No presente recurso de constitucionalidade, a questão colocada a este Tribunal prende-se, todavia, com a específica invocação de a aplicação ( ex vi do artigo 228.º, n.º 1, do Código de Processo Penal) do regime normativo do arresto constante do Código de Processo Civil nos moldes enunciados (isto, é, sem prévia audição do requerido) afrontar os direitos de defesa do arguido em processo penal, «nomeadamente do princípio do contraditório e do direito de audição prévia constitucionalmente consagrados nos n. os 1 e 5 do artigo 32.º da CRP, em especial no que respeita à imperiosa contraditoriedade prévia quanto ao decreta- mento de medidas de coação e garantia patrimonial», a que acresceria a violação dos princípios da igualdade e da presunção de inocência dos arguidos. A questão que cumpre apreciar é, assim, a de saber se consubstancia a norma (interpretação normativa) impugnada uma afronta aos direitos do arguido, se e na medida em que – como defende – a sua qualidade de arguido e a circunstância de o arresto de bens ter sido determinado no âmbito de um processo criminal exi- gem diferentes garantias no respectivo decretamento para efeitos de acautelar os direitos e princípios próprios do processo penal e que lhe assistem enquanto arguido. Especificamente: é inconstitucional a norma contida no artigo 228.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de que pode ser decretado o arresto preventivo sem audição prévia do arguido? Ora, a resposta é negativa. Vejamos porquê: 18.1. Desde logo, verifica-se que, no domínio dos direitos constitucionais com incidência processual, o recorrente alega a violação do princípio da presunção da inocência (artigo 32.º, n.º 2, da Constituição) e das garantias de defesa dos arguidos, em especial o direito ao contraditório e à audição prévia (artigo 32.º, n. os 1 e 5, da Constituição). Começando a análise por estes últimos, considera-se, a partir do disposto nos n. os 1 e 5 do artigo 32.º, que ambos os direitos têm um conteúdo muito amplo, exigindo a Constituição que o processo penal assegure todas as garantias de defesa do arguido. Não se nega pois que a ampla proteção constitucional ao arguido em processo criminal inclui, como escrevem Gomes Canotilho e Vital Moreira ( Constituição da República Portuguesa Anotada , I, 4.ª edição, Coimbra, 2007, p. 516), «o direito do arguido “a ser ouvido”, enquanto direito a dispor de oportunidade processual efetiva de discutir e tomar posição sobre quaisquer decisões que o afetem. Na verdade, a enunciação maximizante do direito de defesa tem que ser compreendida como uma manifestação qualificada, em processo criminal, do direito a tutela jurisdicional efetiva (artigo 20.º da CRP), englobante do direito a um processo equitativo, pelo que dele decorre necessariamente um direito de audi- ção, materialmente imposto pela conformação processual ao princípio do contraditório (n.º 5 do artigo 32.º da Constituição).». Como também já se escreveu no Acórdão n.º 555/08, «(…) o sentido tutelador do princípio do con- traditório e as garantias de defesa que dele emanam só encontram realização correspondente ao que a

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