TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

390 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 26.º Nos presentes autos, esse limite é imposto por lei ordinária, concretamente pelos arts 196.º n.º 2 e 235.º do CEP ( ex vi artigo 414.º do CPP). 27.º Daqui decorreu o fundamento para o arguido/recluso interpor recurso para o Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 70.º n.º 1 alínea b) da Lei 28/82 de 15 de novembro. 28.º O presente recurso destina-se a apreciar a constitucionalidade do artigo 196.º n.º 2 do CEP, aplicada nos presentes autos, pelo facto do Ministério Público ter mais poderes que o arguido recluso, em prejuízo deste (artigo 196.º, n.º 1 do CEP), já que vê o seu direito negado, em violação com o estatuído no artigo 32.º n.º 1 da Consti- tuição – garantias de defesa do arguido – e dos princípios da igualdade, proporcionalidade, não discriminação e os fins das penas, previstos na Lei Fundamental. 29.º A norma que se pretende ver apreciada impede o arguido recluso de recorrer contra decisão que não lhe concedeu a licença de saída jurisdicional, o que está em claro confronto com a Constituição da República Portu- guesa, nomeadamente com os artigos 2.º, 9.º, 18.º, e 32.º n.º 1 e ainda o artigo 13.º “Direito a recurso efetivo, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem”, e artigo 8.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 10 de dezembro de 1948, aprovado e publicado em Diário da República a 9 março de 1978. 30.º A dita norma põe em causa direitos fundamentais, concretamente o Direito ao Recurso, incorporado na Constituição da República, na 4.ª revisão Constitucional, aprovada pela Lei n.º 1/1997 de 20-09, que ao seu artigo 32.º, n.º 1, lhe acrescentou a expressão “incluindo o recurso”. 31.º Prevê o artigo 8.º da DUDH que toda a pessoa tem direito a recurso efetivo para as jurisdições nacionais competentes contra atos que violem direitos fundamentais reconhecidos pela Constituição ou pela Lei. 32.º É sobejamente reconhecido que assiste a todos, pelo menos, um grau de recurso efetivo. 33.º In casu, isso não aconteceu, porquanto o artigo 196.º n.º 2 do CEP prevê essa proibição oculta, essa res- trição, essa limitação aos direitos do recluso. 34.º Porém, o Ministério Público, pelo n.º 1 do mesmo artigo 196.º pode recorrer da decisão que conceda, recuse ou revogue. 35.º Não se acolhe a fundamentação do Exmo. Sr. Vice-Presidente do Tribunal da Relação do Porto, no des- pacho com data de 15 de novembro de 2013, quando refere que “o reclamante parece não dar conta, ou relevo, à circunstância de a possibilidade de o Ministério Público recorrer da decisão de recusa não considerar uma desigual- dade em desfavor do condenado, pois essa possibilidade de recurso do Ministério Público foi consagrada formal e materialmente em favor do arguido, não é um direito concedido ao Ministério Público em desfavor do arguido é um direito, que o Ministério Público exercita ou não, em favor do condenado, constituindo mais uma garantia para o condenado”. 36.º Isto porque o artigo 196.º n.º 1 do CEP não tem na sua génese um direito do arguido recluso, já que o MP pode recorrer contra ou em favor do recluso e não exclusivamente em favor do recluso, havendo exemplos de jurisprudência superior em que o MP recorreu de facto contra o recluso, o que configura assim uma desigualdade de direitos das partes, pois o MP tem a opção de recorrer, mas o recluso não tem essa opção. 37.º O argumento do Tribunal da Relação do Porto não levou em conta o facto de apenas o Ministério Público poder recorrer da decisão que “conceda” a licença de saída jurisdicional, prejudicando assim o recluso, que não o pode fazer. 38.º Há por isso uma clara desigualdade de armas (entre o arguido recluso e o MP) que o Tribunal da Relação do Porto não considerou, pois cingiu-se e limitou-se a uma interpretação literal do conteúdo da norma ora em crise (artigo 196.º n.º 2 do CEP). 39.º Isto porque o Ministério Público, a uma decisão do TEP que conceda a licença de saída jurisdicional, pode recorrer contra o recluso; porém, se for recusada essa licença de saída jurisdicional ao recluso, este não tem o mesmo poder recursório de que possa abrir mão, em defesa dos seus direitos, garantindo a igualdade de armas – processo equitativo. 40.º Defendeu ainda a decisão singular do Tribunal da Relação do Porto que o catálogo de direitos do artigo 32.º da Constituição está perspetivado tendo em vista fundamentalmente o arguido e não o condenado. 41.º Ora, tal argumento é quase ofensivo dos direitos do arguido recluso.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=