TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

400 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL do artigo 32.º da Constituição está perspetivado tendo em vista fundamentalmente o arguido e não o condenado. Esse normativo deve ser lido no contexto que efetivamente disciplina, o processo criminal até à decisão final transi- tada em julgado, como a referência a arguido – e não também condenado –  leva a intuir. No caso estamos na fase de execução da pena, fora do âmbito de previsão daquele normativo. A Constituição não define, positivamente, quais os direitos, bens ou valores cuja perda ou restrição pode cons- tituir uma pena. Excetuando o limite expresso do artigo 30.º, n.º 4 e os resultantes dos artigos 24.º, n.º 2 e 26.º, deixou a Constituição para o legislador ordinário um amplo campo de discricionariedade no desenho da execução de penas. Quanto ao condenado, que mantém a titularidade dos direitos fundamentais não incompatíveis com a sua situação prisional, no desenho dos limites tem de se ponderar e balancear com as limitações inerentes ao sentido da condenação e as exigências próprias da execução da pena, artigo 30.º n.º 5 da Constituição. Essa ponderação foi feita por quem tem, em primeira linha, para tal legitimidade, o legislador, em diploma recente. Balanceando os interesses conflituantes consagrou o legislador um sistema parcimonioso de recursos: nem um irrestrito direito de recurso, nem a proibição total de recurso das decisões do TEP. Parece-nos que a restrição em causa não limita de modo arbitrário ou desproporcionado o direito de o con- denado sindicar decisões que julgue desfavoráveis, antes concilia de modo razoável os interesses contraditórios em confronto. Não nos parece por isso que a solução legislativa viole os artigos 18.º e 32.º n.º 1 da Constituição, quando, como se deve, se perspetiva o problema no contexto do artigo 30.º, n.º 5 da Constituição. Esquece o reclamante que do direito à liberdade – no seu caso legalmente restringida por decisão judicial tran- sitada em julgado – não deriva uma automática concessão de licença de saída. Acresce que a licença de saída, nos termos em que continua legalmente prevista, podem ser concedidas ao recluso licenças de saída, artigo 76.º n.º 1 do CEP, e nos termos em que foi recomendada pelo Conselho da Europa R(82)16, adotada pelo Comité de Minis- tros de 24 de setembro de 1982, não é um direito do recluso, quando muito é um interesse legalmente protegido, inserindo-se no poder-dever do modo de execução de uma pena de prisão. A rematar duas notas: A matéria de recursos em sede de execução da pena mereceu, na génese da lei que aprovou o CEP, amplo debate, passou pelo crivo da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, onde esteve desde 27 de fevereiro de 2009 a 12 de agosto de 2009 e onde foram ouvidas as mais variadas entidades. De seguida passou pelo “crivo” do Presidente da República que entre as questões de conformidade com a Constituição que suscitou não identificou a presente. Donde sem necessidade de outros considerandos se mantém a decisão reclamada». Cumpre apreciar e decidir. II – Fundamentação 6. O recorrente, em cumprimento de pena privativa da liberdade, requereu ao Tribunal de Execu- ção das Penas do Porto a concessão de uma licença de saída jurisdicional, pedido que foi recusado. Dessa decisão interpôs recurso para o Tribunal da Relação, o qual não foi admitido com base no n.º 2 do artigo 196.º do Código de Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade (CEPMPL), aprovado pela Lei n.º 115/2009, de 12 de outubro, que apenas permite ao recluso recorrer da decisão que revogue a licença de saída jurisdicional. Da decisão de não admissão do recurso reclamou para o Presidente da Relação, reclama- ção que também foi indeferida. Solicita então ao Tribunal Constitucional que aprecie se a norma do n.º 2 do artigo 196.º do CEPMPL viola o princípio do duplo grau de jurisdição, decorrente do n.º 1 do artigo 32.º da Constituição (CRP), uma vez que não permite ao recluso recorrer da decisão que recusa aquela licença, e se viola o princípio

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