TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

404 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL medida. As saídas precárias eram assim caracterizadas como medidas individuais de tratamento penitenciário que deviam ser objeto de «um plano global prévio» (n.º 4 do artigo 57.º), que obedeciam às «condições a fixar para cada caso» (n.º 4 do artigo 50.º), cuja negação não podia ser entendida como medida disciplinar (n.º 1 do artigo 55.º), e que não podiam prejudicar a segurança e ordem pública (n.º 2 do artigo 58.º). O atual Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade – a Lei n.º 115/2009, de 12 de outubro (alterada pelas Leis n.º 33/2010, de 2 de setembro, n.º 40/2010, de 3 de setembro, e n.º 21/2013, de 21 de fevereiro) – “renovando” o pensamento socializador que anda associado à execução das penas priva- tivas da liberdade, regula o instituto das licenças de saída do estabelecimento prisional no Capítulo IV, onde distingue dois tipos de licenças: (i) licenças de saída jurisdicionais, que visam a manutenção e promoção dos laços familiares e sociais e a preparação para a vida em liberdade (n.º 2 do artigo 76.º); (ii) licenças de saída administrativas, que compreendem quatro categorias: a) saídas de curta duração, para manter e promover os laços familiares e sociais; b) saídas para realização de atividades; c) saídas especiais, por motivos de particular significado humano ou para a resolução de situações urgentes e inadiáveis; d) saídas de preparação para a liberdade. Qualquer uma destas categorias de licenças só pode ser concedida se ocorrerem e forem ponderados os requisitos e critérios gerais enunciados nos n. os 1 e 2 do artigo 78.º Ou seja, é necessário que se verifique (i) fundada expectativa de que o recluso se comportará de modo socialmente responsável, sem cometer crimes, (ii) fundada expectativa de que o recluso não se subtrairá à execução da pena ou medida privativa da liber- dade, (iii) compatibilidade da saída com a defesa da ordem e da paz social. E tendo em conta a finalidade de cada uma das licenças de saída, na sua concessão devem ser ponderados fatores, como: (i) a evolução da exe- cução da pena, (ii) a necessidade de proteção da vítima, (iii) o ambiente social ou familiar em que o recluso se vai integrar, (iv) as circunstâncias do caso, (v) e os antecedentes conhecidos da vida do recluso. Como a execução da pena de prisão deve ser orientada pelo princípio da individualização do tratamento prisional e baseada na avaliação das necessidades e riscos próprios de cada recluso (n.º 1 do artigo 5.º), as licen- ças de saída devem ainda ser programadas tendo em conta o normal desenvolvimento das atividades do recluso (n.º 7 do artigo 77.º); devem fazer parte do plano individual de readaptação do recluso (n.º 3 do artigo 23.º); na sua concessão podem ser fixadas condições, adequadas ao caso concreto, a observar pelo recluso (n.º 3 do artigo 78.º); o período de saída é considerado tempo de execução da pena (n.º 1 do artigo 77.º); e a não concessão não pode, em caso algum, ser utilizada como medida disciplinar (n.º 3 do artigo 77.º).  As licenças de saída jurisdicionais, as que aqui nos interessam, são concedidas e revogadas pelo juiz de execução das penas [n.º 1 do artigo 79.º, e alínea b) do n.º 4 do artigo 138.º], quando, para além das referidas condições gerais, se verifiquem cumulativamente as seguintes condições especiais: (i) o cumpri- mento de um sexto da pena e no mínimo seis meses, tratando-se de pena não superior a cinco anos, ou o cumprimento de um quarto da pena, tratando-se de pena superior a cinco anos; (ii) a execução da pena em regime comum ou aberto; (iii) a inexistência de outro processo pendente em que esteja determinada prisão preventiva; (iv) a inexistência de evasão, ausência ilegítima ou revogação da liberdade condicional nos 12 meses que antecederam o pedido (n.º 1 do artigo 79.º). O período de saída não pode ultrapassar o limite máximo de cinco ou sete dias seguidos, consoante a execução da pena decorra em regime comum ou aberto, a gozar de quatro em quatro meses (n.º 2 do artigo 79.º); em caso de não concessão da licença, o recluso pode renovar o pedido após quatro meses a contar da data daquela decisão, podendo o juiz fixar prazo inferior (artigo 84.º); o incumprimento injustificado das condições impostas na licença de saída determina a impossibilidade de renovação do pedido durante seis meses ou a revogação da licença, neste caso, com des- conto no cumprimento da pena do tempo em que o recluso esteve em liberdade (n. os 1 e 3 do artigo 85.º); e a concessão da licença segue a forma processual regulada no Capítulo VI do CEPMPL, onde se encontra a norma impugnada – o artigo 196.º – que não permite ao recluso interpor recurso jurisdicional da decisão de não concessão da licença.

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