TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

420 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL K) A ora recorrente não ignora que o princípio constitucional da tributação segundo o lucro real não constitui um princípio absoluto, podendo sofrer desvios e mesmo derrogações em virtude do caráter preponderante de outros valores em conflito. Contudo, é evidente que os desvios e as derrogações a tal princípio, corolário do princípio da igualdade tributária, para que sejam constitucionalmente justificáveis e admissíveis, devem ser feitos de forma ponderada, proporcional e na medida estritamente necessária à proteção dos valores que visam atingir; L) Esta necessária ponderação de valores é, aliás, uma exigência e uma decorrência direta do princípio constitu- cional da igualdade, cuja concretização exige a articulação entre o direito dos contribuintes serem tributados de acordo com a capacidade contributiva revelada e outros objetivos legítimos do sistema fiscal, como a busca pela simplificação dos tributos e o combate à fraude e à evasão fiscal; M) Como já decidiu este Venerando Tribunal, Diga-se, desde logo, que tais análises de inconstitucionalidade têm de ser parametrizadas (e balanceadas) com a investigação jurídica do conteúdo e razão de ser dos preceitos em causa A análise dos preceitos jurídicos aplicáveis, no seu recorte, conteúdo e razão de ser iluminam e explicam a constitucionalidade ou inconstitucionalidade dos mesmos, face aos princípios orientadores de todo o siste- ma legal. — vide Acórdão n.º 137/14; N) Mais, no acórdão proferido no processo n.º 137/2014, este Venerando Tribunal defendeu que, “Pode haver custos económicos sem reconhecimento fiscal – e com isso não se viola a Constituição (aliás, a tributação das empresas incidirá fundamentalmente – e não totalmente – sobre o lucro real – Cfr. artigo 104.º-2, da Constituição). Nestes casos, é mister que exista um fundamento adequado, necessário e proporcionado para justificar essa distorção”; O) No caso em análise, é pacífico que o legislador pretendeu combater as situações de abuso e fraude à lei, em que os sujeitos passivos procediam à alienação de participações sociais por valores inferiores aos de mercado ou como forma de realizar uma perda, que de outra forma, se manteria latente e sem relevância fiscal, pelo que admite-se a existência de um interesse público subjacente de reposição da distribuição igualitária da carga fiscal, que vinha sendo deturpada pela realização dos referidos negócios entre partes relacionadas. P) Contudo, estando em causa da restrição de um princípio constitucional, é necessário averiguar, se a medida não é desproporcionada à luz dos três subprincípios em que se desdobra o princípio da proporcionalidade, a saber, adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito, sendo que a norma ora sindicada coloca em crise de forma irremediável o princípio da necessidade. Q) De acordo com o referido principio, uma determinada medida restritiva pode ser admissível, se, sendo adequa- da e proporcional, for também a necessária, exigível, para prosseguir o fim em causa ( i. e. , o combate à ilisão fiscal nas situações descritas), por o legislador não dispor de outros meios menos restritivos para alcançar o mesmo desiderato. R) A norma em apreço não é necessária á obtenção dos fins visados pelos legislador, existindo no ordenamento tributário outros regimes menos restritivos dos direitos do contribuintes que permitem alcançar o mesmo fim, designadamente a aplicação da cláusula geral antiabuso, consagrada no n.º 2 do artigo 38.º da LGT e do regime dos preços de transferência, consagrado no artigo 63.º do CIRC. S) Ainda que se admitisse que tais regimes não seriam suficientes para obstar a que os contribuintes lograssem, por exemplo, precipitar a realização de uma menos-valia (ou variação patrimonial negativa) que de outra forma continuaria latente, sem relevância fiscal, ou que se tomavam demasiado onerosos de aplicar, ainda assim, a medida que foi em concreto aplicada não seria a adequada porquanto, em qualquer caso, excede o necessário para obstar às situações de abuso, na medida em que não permite ao contribuinte a ilisão da presunção de abuso de que é alvo. T) No máximo, poder-se-ia admitir que, por regra, as menos-valias realizadas com a alienação de partes de capital a entidades relacionadas não fosse dedutível, ressalvando-se a possibilidade de o contribuinte provar a inexis- tência de abuso, como aliás sucede no caso em discussão nos autos. Tal possibilidade de ilisão da presunção de abuso em nada prejudicaria a eficácia da norma e os fins por ela prosseguidos, na medida em que todo o

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