TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

427 acórdão n.º 753/14 – o que está em causa não é a possível concertação de preços mas a realização de transações que envolvam participações sociais entre partes relacionadas. E, nesses termos, o sujeito passivo não obteria qualquer vanta- gem com a demonstração de que a transação foi efetuada ao preço de mercado, nem essa demonstração seria suficiente para validar a substância económica da operação. 7. Poderia, no entanto, ainda dizer-se que a norma do artigo 23.º, n.º 7, do CIRC, na medida em que impõe a irrelevância fiscal das variações patrimoniais negativas resultantes da transmissão de partes do capital entre sociedades relacionadas, não deixa de constituir uma presunção sujeita a não admissão de prova, que, como tal, poderia violar o princípio da capacidade contributiva. O Tribunal Constitucional pronunciou-se já no sentido da inconstitucionalidade de disposições fiscais que estabeleciam presunções inilidíveis, como sucedeu em relação à norma do artigo 14.º, § 2, do Código do Imposto de Capitais, na redação do Decreto-Lei n.º 197/82, de 21 de maio, que não permitia a ilisão da one- rosidade dos mútuos feitos pelas sociedades a favor dos respectivos sócios (Acórdão n.º 348/97), e à norma do artigo 26.º do Código do Imposto Municipal da Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações, na reda- ção do Decreto-Lei n.º 308/91, de 17 de agosto, que consignava, nas transmissões por morte, não ocorrendo “arrolamento judicial dos mobiliários”, uma presunção sem admissão de prova em contrário da existência de uma determinada quota de “mobílias, dinheiro, joias, e mais objetos de uso pessoal ou doméstico”. Esse entendimento tem sido também sufragado pela doutrina, considerando-se que essa técnica legisla- tiva, movida por legítimas preocupações de simplificação e de praticabilidade das leis fiscais e de combate à evasão e fraude fiscais, «tem de compatibilizar-se com o princípio da capacidade contributiva, o que passa, quer pela ilegitimidade constitucional das presunções absolutas, na medida em que obstam à prova da inexis- tência da capacidade contributiva visada na respectiva lei, quer pela exigência de idoneidade das presunções relativas para traduzirem o correspondente pressuposto económico do imposto» (Casalta Nabais, O Dever Fundamental de Pagar Impostos , Coimbra, 1998, p. 498). No entanto, no caso vertente, é, desde logo, discutível que a norma do artigo 23.º, n.º 7, do CIRC configure uma presunção para efeitos fiscais. As presunções são ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto des- conhecido. Tratando-se de uma presunção legal, quem tem a seu favor a presunção escusa de provar o facto a que ela conduz, implicando a inversão do ónus da prova (artigos 349.º e 350.º do Código Civil). A pre- sunção é por isso um meio de prova, cabendo à parte fazer a prova do facto conhecido (base da presunção) para dele permitir inferir o facto desconhecido (facto presumido). O reconhecimento do facto que se extrai da inferência só pode ser posto em causa através da prova em contrário, se a lei a admitir. As presunções em matéria de incidência tributária podem ser explícitas, quando são reveladas pelo uso da expressão «presume-se» ou de expressão de idêntico significado, mas podem também resultar implicita- mente do enunciado linguístico da norma, o que sucede quando se considera como constituindo matéria tributável determinados valores de bens móveis ou imóveis no pressuposto de que são esses valores que cor- respondem à realidade, prescindindo-se do apuramento do valor real ou do valor que tiver sido declarado pelo sujeito passivo. É o que ocorre com a disposição do artigo 58.º, n.º 1, do CIRC, que, no âmbito das operações comerciais ou financeiras efetuadas entre um sujeito passivo e outra entidade com quem mantenha relações especiais, admite a dedução de custos por referência aos preços que seriam praticados, em operações comparáveis, entre entidades independentes. Ou ainda com a norma do artigo 21.º, n.º 2, que em matéria de variações patrimoniais positivas, considera como valor de aquisição dos incrementos patrimoniais obtidos a título gratuito o seu valor de mercado (cfr. Diogo Leite Campos/Benjamim Silva Rodrigues/Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária Anotada e Comentada , 4.ª edição, Lisboa, pp. 651-652). Não é esse o caso do artigo 23.º, n.º 7. A norma não ficciona um determinado valor para a transação de participações sociais entre entidades que se encontrem em relações especiais, para assim fixar o montante dedutível a título de variações patrimoniais negativas, mas veio antes impedir o reconhecimento das perdas criadas pela realização de menos-valias em operações desse tipo, independentemente da verificação do valor

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