TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

428 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL praticado e da justificação do custo. Assim, a lei não permite considerar um qualquer valor presumível, em substituição do valor praticado ou declarado, mas determina antes a impossibilidade de deduções à matéria coletável que tenham por base a transmissão onerosa de participações entre sociedades relacionadas. A norma não funciona, por isso, como meio de prova para obter um certo valor de custos ou perdas que deva ser con- siderado para o apuramento do lucro tributável. Poderia dizer-se que o regime legal assenta na ideia de que as operações efetuadas nessas circunstâncias têm uma finalidade puramente fiscal e não económica. Mas essa poderá ser a razão de política legislativa que levou o legislador a declarar indedutíveis os custos realizados nesse tipo de transações. Não há aqui uma presunção em sentido próprio. A norma não permite presumir um qualquer facto tributário, a partir da ocorrência de transacções de partes de capital entre empresas em relação de grupo, que o sujeito passivo pudesse contraditar através de um procedimento de prova. Limita-se a desqualificar como custo os resultados negativos que provenham dessas transações. Certo é que essa desqualificação pode determinar um aumento do imposto a liquidar por virtude de não ser possível refletir na matéria coletável as perdas imputáveis à operação. Mas essa é a necessária decorrência de um mecanismo legal de funcionamento automático que incide sobre os critérios de dedutibilidade dos custos ou perdas. Tratando-se de um critério legal de apuramento da matéria coletável, e não de um facto tributário presumível que seja imputável ao sujeito passivo, não tem cabimento a admissão da prova em contrário. 8. A questão que se coloca é a de saber se a não dedutibilidade dos custos, nos termos previstos, não constitui uma restrição inaceitável ao direito de ser tributado segundo o lucro real. Deste ponto de vista, e contrariamente ao que defende a recorrente, não é inteiramente despicienda a abordagem feita no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 85/10, que julgou não inconstitucional a norma do artigo 42.º, n.º 3, do CIRC na medida em que se veio a declarar dedutível apenas em metade do seu valor as menos valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, independentemente das condições da sua realização. Há seguramente uma relação de especialidade entre as normas dos artigos 23.º, n.º 7, e 42.º, n.º 3, sendo a particular circunstância de a operação ser realizada entre empresas que se encontram numa relação de dependência entre si que justifica o regime de indedutibilidade total das perdas, por contraposição ao cri- tério geral resultante do disposto no artigo 42.º, n.º 3, que é aplicável às transações efetuadas entre entidades independentes. Em qualquer dos casos, a não dedutibilidade de encargos para efeitos fiscais, que consta do artigo 42.º do CIRC, podendo representar potencialmente uma limitação ao princípio da tributação segundo o lucro real, encontra justificação em diversas ordens de razões, que poderão relacionar-se com a quantificação téc- nica do imposto ou com a dificuldade de inserção da despesa na esfera empresarial ou na atividade lucrativa (quanto a estes aspetos, Saldanha Sanches, ob. cit. , pp. 393-394) E ainda que, em tese geral, o princípio da capacidade contributiva implique que deva ser considerado como tributável apenas o rendimento líquido, com a consequente exclusão de todos os gastos necessários à produção ou obtenção do rendimento, o certo é que não pode deixar de reconhecer-se ao legislador – como admite a doutrina – «uma certa margem de liberdade para limitar a certo montante, ou mesmo excluir, certas deduções específicas, que, embora relativas a despesas necessárias à obtenção do correspondente rendimento, se revelem de difícil apuramento» (Casalta Nabais, ob. cit. , p. 521). O ponto é que tais limitações ou exclu- sões tenham um fundamento racional adequado e se apliquem à generalidade dos rendimentos em causa. Trata-se de opções de política fiscal que assentam numa ideia de praticabilidade, que exige ao legislador a elaboração de leis cuja aplicação e execução seja eficaz e económica ou eficiente, e que conduzam a resultados consonantes com os objetivos pretendidos. Com essa finalidade, com que se pretende também assegurar os princípios materiais da igualdade e da justiça fiscal, é constitucionalmente justificável que o legislador possa recorrer não apenas às referidas presunções legais, mas também a técnicas de tipificação e de simplificação,

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