TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014
44 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 4. O princípio da proporcionalidade mostra-se ainda violado, desde logo na sua vertente de adequação, em relação às disposições que elevam para 3,5% o desconto aplicável aos beneficiários dos Serviços de Assis- tência na Doença da GNR e da PSP (SAD) e da Assistência na Doença aos Militares das Forças Armadas (ADM). Não tem aplicação, neste caso, a facultatividade da inscrição e também não é invocável o princípio da autosustentabilidade do sistema, na medida em que as despesas relativas à saúde operacional deverão ser sem- pre suportadas por financiamento público e não poderão ser imputadas as receitas que provenham exclusiva ou prevalecentemente das contribuições dos beneficiários. Não sendo exigível o pleno autofinanciamento dos subsistemas de saúde – que serão necessariamente deficitários – nem a sua autosustentabilidade a prazo –, a medida é inadequada em relação ao fim que se propõe atingir. – Carlos Alberto Fernandes Cadilha. DECLARAÇÃO DE VOTO 1. Votei vencido por não poder acompanhar os fundamentos em que se apoiou a maioria que fez venci- mento e que constituem a ratio decidendi do Acórdão a que esta declaração se refere. 2. Relativamente ao juízo de conformidade das normas questionadas com o princípio da proibição do excesso – o parâmetro constitucional onde se localiza a minha divergência – são duas as principais linhas de argumentação do acórdão: (i) é razoável que a autossustentabilidade de um sistema de saúde pressuponha a constituição de excedentes financeiros; (ii) sendo a ADSE um subsistema pautado pela liberdade de inscrição e pela liberdade de manutenção, o aumento em um ponto percentual da contribuição devida pelos beneficiá- rios não se mostra excessivo, uma vez que sempre podem renunciar à inscrição. Sendo o fim das normas impugnadas a autossustentabilidade dos subsistemas de saúde, o ponto de par- tida para o controlo jurisdicional da legitimidade constitucional da decisão de aumentar a contribuição deve ser a situação financeira relatada no Plano de Actividades da ADSE para 2014. Aí se refere que: «a estimativa das receitas do desconto, tomando em consideração os valores cobrados no mês de janeiro de 2014 e à taxa de desconto de 2,5%, (...) permite prever uma receita de desconto, ou seja, uma contribuição do beneficiário na ordem dos 411 milhões de euros que, só por si, permitem financiar os compromissos do ano. Consequente- mente, a aplicação da taxa de desconto de 3,5% permitirá receitas adicionais que deverão ser afectas a 2015, pelo que será importante criar mecanismos flexíveis para a utilização dos saldos que vierem a apurar-se». Acresce que, segundo dados não controvertidos do processo, (i) no ano de 2013 a ADSE teve um saldo positivo de 55,2 milhões de euros, (ii) no ano de 2014 prevê-se um excedente de 284,7 milhões de euros, que será de 140,7 milhões se for retirada a contribuição da entidade patronal, (iii) que uma contribuição de 2,6% era suficiente para custear as despesas previstas para 2014, (iv) e que em oito anos a contribuição dos beneficiários aumentou 250%, sendo que, relativamente ao primeiro semestre de 2013, aumentou 133%. A contribuição para a ADSE (ou SAD e ADM) tem a natureza jurídica de contribuição financeira, o tertium genus de tributos que foi introduzido na alínea i) do n.º 1 do artigo 165.º da CRP pela Revisão Constitucional de 1997. Trata-se de uma prestação pecuniária imposta a título de remuneração de despesas de saúde proporcionadas a um determinado grupo de beneficiários. É, pois, uma contribuição de carácter «bilateral», porque não é pensável que fosse criada sem que hou- vesse reciprocidade com outra prestação. A existência de um sinalagma directo entre o que é pago pelos beneficiários daqueles subsistemas de saúde e os cuidados de saúde que dele obtêm em troca é uma das carac- terísticas que permite distinguir, em termos jurídico-constitucionais, a contribuição financeira do imposto. E esta função comutativa não é afastada pelo facto de servir também para financiar a solidariedade entre beneficiários, o que é feito através da base de incidência da contribuição, na medida em que os beneficiários que auferem maior remuneração financiam mais dos que recebem menos (função distributiva).
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