TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

440 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Repare-se: Portugal tem o salário mínimo mais baixo da zona euro; Com o aumento do custo de vida por um lado; E o congelamento daquele valor por outro lado; Teve por consequência um crescimento abrupto dos números da pobreza em Portugal; Em 2010, o limiar da pobreza foi definido nos € 434 euros; Depois dos impostos e outros encargos os reformados com salário mínimo ou inferior – como é o caso – ficam abaixo daquele limiar; E é com os subsídios de férias e de Natal que logram manter-se à tona da sobrevivência; Mas sempre em situação de debilidade que não pode ser afetada pela penhorabilidade nos termos definidos no presente processo pelas instâncias judiciais que apreciaram esta matéria; Num contexto em que a pobreza alastra e aumenta impõe-se, por uma questão de direitos humanos, que se não olhe para a questão posta à douta apreciação deste Tribunal de forma simples e meramente aritmética; Um último fator pesa (tem de pesar) na interpretação que se deva dar às normas invocadas nesta sede; É a notória desconformidade (já hoje) do próprio valor do salário mínimo nacional com aquele patamar de dignidade que se tem entendido dever preservar-se e, por isso, se designa de retribuição mínima; Em dezembro de 2006 a retribuição mínima mensal garantida foi objeto de um acordo tripartido sobre a sua fixação e evolução; Assinado, então, pelo Governo e pelos parceiros sociais no âmbito da Comissão Permanente de Concertação Social do Conselho Económico e Social; Acordou-se em concertação social que, em 2011, o salário mínimo chegaria a € 500; Como sabemos o salário mínimo ficou e permanece congelado nos € 485; Este incumprimento tem sido mantido, num contexto em que o seu valor está longe do que é preconizado na Carta Social Europeia subscrita pelo Estado Português que estabelece que o salário mínimo líquido deve ser 60 do salário médio; Se essa fosse a referência a cumprir, o salário mínimo ultrapassaria já os € 600; Como se dizia em texto do Concílio Vaticano II, é preciso satisfazer “antes de mais as exigências da justiça, nem se ofereça como dom da caridade aquilo que já é devido a título de justiça; suprimam-se as causas dos males, e não apenas os seus efeitos”; A impenhorabilidade que está aqui em discussão é, pois, uma questão elementar de justiça; É uma exigência do combate à pobreza, à exclusão à salvaguarda das pessoas que se apresentam privadas de exercer a sua plena cidadania e dignidade; Para mais que – aliás é aceite pelo Exequente – vide contra alegações em sede de Agravo – são desconhecidos quaisquer outros bens ao executado aqui recorrente; O compromisso de € 500 em 2011 colocam uma perspetiva de recuperação do poder de compra do salário mínimo nacional o que representa um fator importante no combate à pobreza e às desigualdades; É da experiência comum que os mais débeis é com este “extra” que, apesar de também inferior ao salário mínimo, colmatam e tapam as brechas que vão surgindo ao nível das despesas de um ano de vida; Posto que se impõe a inconstitucionalidade das interpretações em causa à luz desta perspetivas; Sob pena de um sacrifício excessivo e desproporcionado que fere a dignidade da sua pessoa. Em conclusão: I – A interpretação da norma que resulta da conjugação do disposto na alínea b) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 824.º do CPC, na parte em que permite a penhora até 1/3 das prestações periódicas, pagas ao executado que não é titular de outros bens penhoráveis suficientes para satisfazer a dívida exequenda, a título de regalia social ou de pensão, cujo valor não seja superior ao salário mínimo nacional e a interpretação da norma que resulta da conjugação do disposto na alínea b) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 824.º do CPC, na parte em que permite a penhora até 1/3 das prestações periódicas, pagas ao executado que não é titular

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