TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

444 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Esse mesmo entendimento viria a ser confirmado pelo referido Acórdão n.º 177/02, do Pleno, que decla- rou a inconstitucionalidade dessa anterior redação do artigo 824.º do CPC, frisando bem que se torna impres- cindível garantir esse mínimo de subsistência do ser humano que é intrínseco ao princípio da dignidade da pessoa humana e que tal mínimo deveria ser aferido pelo montante equivalente ao salário mínimo nacional. Encontrando-se protegido o montante equivalente ao salário mínimo nacional, considerou este Tribu- nal que não se verificava uma efetiva afetação do núcleo essencial da dignidade da pessoa humana, que se expressaria na obtenção de quantia indispensável à subsistência. 6. Mas a questão de constitucionalidade, propriamente dita, colocada pelo recorrente prende-se com a afetação, pela penhora, do valor pago a título de aposentação quando este coincida com o pagamento simultâneo da pensão mensal e do acréscimo correspondente a subsídio de férias ou a subsídio de Natal. Isto é quando essa penhora afete integralmente o montante do subsídio de férias ou de Natal – porque pago juntamente com a pensão mensal – e não apenas a parcela de cada um daqueles subsídios que fosse superior ao salário mínimo nacional.  Independentemente da natureza jurídica dos subsídios de férias e de Natal – que para o caso em apreço não releva – verifica-se que o critério normativo aplicado pelo tribunal recorrido foi o de que nos meses em que são pagos os subsídios de férias e de Natal aos respetivos beneficiários, estes se incorporam e se fundem com o montante base (e usual) da pensão paga mensalmente, pelo que, surgindo ao Tribunal Constitucional como um dado, é sobre este critério normativo que temos de nos debruçar.  Assim sendo, o que se tem de averiguar é se se deve reputar de atentatório da dignidade da pessoa humana, por colocar em crise o mínimo essencial à subsistência do recorrente, que se interprete a norma extraída da conjugação da alínea b) do n.º 1 com o n.º 2 do artigo 824.º do CPC, na redação anterior à atualmente vigente, no sentido de ser admissível a penhora de todo o montante do pagamento mensal que funda a pensão mensal com um subsídio de férias ou de Natal, desde que fique preservado o montante cor- respondente ao salário mínimo nacional.  Ora, posta assim a questão, constituindo o subsídio de férias e o subsídio de Natal um complemento à pensão normalmente devida, não se vislumbra que possam corresponder a uma quantia que deva ser quali- ficada como garantia desse mínimo essencial à subsistência condigna do recorrente, pelo que a interpretação normativa aplicada pelo tribunal recorrido não se afigura inconstitucional. III – Decisão Em face do exposto, decide-se não julgar inconstitucional a norma extraída “da conjugação do disposto na alínea b) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 824.º do CPC, na parte em que permite a penhora até 1/3 das pres- tações periódicas, pagas ao executado que não é titular de outros bens penhoráveis suficientes para satisfazer a dívida exequenda, a título de regalia social ou de pensão, cujo valor não seja superior ao salário mínimo nacional mas que, coincidindo temporalmente o pagamento desta e subsídio de natal ou de férias se penhore, somando as duas prestações, na parte que excede aquele montante”. E, em consequência, julgar improcedente o recurso. Custas devidas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 25 unidades de conta, nos termos do artigo 6.º, n.º 1, do Regime de Custas no Tribunal Constitucional, aprovado pela Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 91/2008, de 2 de junho. Lisboa, 12 de novembro de 2014. – Ana Guerra Martins – Fernando Vaz Ventura – Pedro Machete – João Cura Mariano (vencido conforme declaração de voto que junto) – Joaquim de Sousa Ribeiro (vencido, con- forme declaração de voto que juntou o Conselheiro Cura Mariano).

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