TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

45 acórdão n.º 745/14 A natureza sinalagmática da contribuição impõe que o seu montante deva ser conformado ou de algum modo reflectir o custo ou valor das prestações de saúde que constituem a sua contrapartida. A consignação da receita das contribuições confirma a finalidade compensatória do custo dos cuidados de saúde presumi- velmente prestados aos beneficiários. Não se trata, porem, de compensar o valor de uma prestação efectiva de saúde a um contribuinte individual, como acontece nas taxas, mas de compensar o custo que as prestações presumidas têm para todo o grupo de beneficiários. O montante da contribuição deve ser assim referenciado aos custos dos cuidados de saúde a prestar ao grupo de beneficiários. Ou seja, dada a bilateralidade da contri- buição, a relação contribuição/custos de saúde não pode ficar arredada da fixação do seu montante, sob pena de se transformar em imposto. Daí que o critério aferidor do montante da contribuição seja o princípio da proporcionalidade, no sentido de que há-de determinar-se essencialmente com base nos custos ocasionados ao grupo de beneficiários. Não obstante a ampla margem de liberdade que o legislador dispõe na determinação do quantum da contribuição, não pode haver contribuições que excedam manifestamente os custos de cuidados de saúde prestados ao grupo de beneficiários. Se a relação bilateral em que se concretiza a contribuição for quebrada pelo excesso do seu montante relativamente aos custos provocados ao grupo, a contribuição não passa o teste da proporcionalidade, caindo no domínio dos impostos. Ora, a situação fáctica que condiciona a fixação do montante de contribuições não pode deixar de ser a relação receitas/despesas dos últimos anos económicos e a previsão de tendências futuras dos componentes que interferem naquela relação. Uma conclusão objectiva que se extrai dos factos acima enunciados é a de que o autofinanciamento da ADSE dá-se com uma contribuição de 2,6%. E não existem quaisquer outros elementos indiciadores de que com esse montante de contribuição a ADSE não seja sustentável a longo prazo. Como a sustentabilidade de um organismo (ou de um Estado) afere-se pelo comportamento que ele tem em relação ao défice e à dívida “excessiva”, o elemento fundamental para fazer essa avaliação está na previsão exacta do comportamento futuro dessa dívida. Ora, com base nos dados acima referidos não se pode fazer juízos de prognose sobre a insustentabilidade da ADSE a longo prazo. Sem transferências do Orçamento do Estado, a ADSE teve em 2013 um saldo excedentário de 55,2 milhões de euros e prevê-se para 2014 um excedente de 284,7 milhões de euros, o correspondente a 65% das despesas.  Não havendo défice ou dívidas, só uma justificação racional, alicerçada em elementos de facto credí- veis, poderia justificar um desvio à tendencial equivalência entre o montante da contribuição e os custos das prestações de saúde auferidas pelo conjunto dos beneficiários.  Numa matéria como esta, em que se convocam direitos fundamentais e princípios constitucionais limitadores do poder tributário, não basta invocar a autossustentabilidade da ADSE como fundamento do aumento percentual da contribuição. Enquadrando-se na figura das restrições (ou limitações) aos direitos, as “contribuições financeiras” apresentam-se como susceptíveis do teste jusfundamental do princípio da proibi- ção do excesso. E daí que as decisões tomadas nesse domínio devam especificar a razão de ser e a finalidade a prosseguir, em termos de serem intersubjectivamente encaradas como racionalmente adequadas, necessárias e proporcionais em sentido estrito. Nesse sentido, poderá dizer-se com Maria Lúcia Amaral, que a «finalidade, prosseguida por cada decisão estadual, deve ser para os seus destinatários – como para qualquer membro da comunidade jurídica – algo de detectável, denominável e compreensível. É evidente que o Estado, sempre que age, busca a melhor rea- lização do interesse público. Mas tal não basta: o que é necessário é que, perante cada decisão, se possa com- preender o modo específico pelo qual, naquele caso, se quis prosseguir o interesse de todos. É a isso mesmo que nos referimos, quando aludimos à “finalidade” ou “razão de ser” de cada decisão estadual e à necessidade da sua inteligibilidade» (cfr. A Forma da República, Coimbra Editora, p. 186). Acontece que o autor das normas questionadas em momento algum referiu as razões que o levam a pre- ver um défice futuro da ADSE, em termos de ser exigível a constituição antecipada de um excedente finan- ceiro que lhe dê cobertura. Do procedimento legislativo até resulta uma explicação para a falta de elementos que suportem a previsão futura de uma situação de insustentabilidade. O Governo começou por justificar o

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