TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

464 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional: I. Relatório 1. A., recorrente nos presentes autos em que são recorridos o Ministério Público e B., foi condenada, por acórdão do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, na pena de prisão de 6 (seis) anos e 10 (dez) meses, pela prática de um crime doloso de homicídio qualificado na forma tentada. Foi ainda condenada no pagamento de € 15 000 (quinze mil euros) a título de danos não patrimoniais ao segundo recorrido. não tendo o mesmo que ser sucessivamente reiterado; porém, decorrendo da Constituição, em proces- so-crime, uma mais intensa vinculação, nomeadamente no tocante ao direito ao recurso, por atuação das garantias previstas no artigo 32.º da Lei Fundamental, o Tribunal Constitucional já proferiu, nesse domínio, diversos juízos de inconstitucionalidade a propósito de casos em que o incumprimento de certos ónus processuais tem um efeito preclusivo no processo, suscitando-se a questão de saber se a atuação desse efeito deve ser antecedido de um convite ao aperfeiçoamento. IV – Desta jurisprudência resulta que, em matéria penal, as situações em que o Tribunal Constitucional considerou ser de censurar a atuação imediata da cominação resultante do incumprimento de deter- minado ónus processual configuram hipóteses de não conhecimento [total ou parcial] do objeto do recurso, ficando por conseguinte o recorrente privado [total ou parcialmente] de uma decisão sobre o mesmo; tratando-se de situações em que o vício inicial afetava as conclusões de recurso, seja porque as mesmas eram inexistentes, seja porque as mesmas se apresentavam insuficientes, omitindo a indicação de certos elementos essenciais face às exigências legais; no domínio do processo civil, a jurisprudência tem concluído, em regra, pela não inconstitucionalidade de interpretações normativas que, perante um incumprimento de prévio despacho de aperfeiçoamento, atuam a cominação preclusiva sem ulte- rior convite à sanação dos vícios. V – Na situação dos presentes autos – ainda que se trate de processo punitivo e esteja em causa recurso do arguido – não significa que seja desprovido de relevância o facto de estarem em causa vícios substan- ciais e não meramente formais: com efeito, a imposição de ónus processuais ligados à inteligibilidade e congruência das motivações apresentadas – no caso em apreço, a coerência entre o pedido e a causa de pedir em que se baseia tal pedido – não configuram exigências excessivas ou desproporcionadas. VI – Com efeito, a ora recorrente peticionou ao tribunal recorrido a declaração de nulidade de toda a prova documental e pericial, não tendo apresentado, na ótica daquela instância, motivação no sentido de se verificar nulidade insanável, nulidade sanável ou utilização de prova absoluta ou relativamente proibi- da; trata-se de um vício de natureza substancial, que ultrapassa a mera constatação da insuficiência do requerimento em causa – trata-se de vício que, desde logo, influencia a própria delimitação do objeto do recurso, traduzida designadamente na delimitação daqueles que virão a ser os poderes de cogni- ção do tribunal ad quem , pelo que, facultar “oportunidade para aperfeiçoar, em termos substanciais, a motivação do recurso deduzido quanto à matéria de facto, quando este não especificou as provas que impunham decisão diversa da recorrida”, “equivaleria, no fundo, à concessão de novo prazo para recorrer, que não pode considerar-se compreendido no próprio direito ao recurso.”

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