TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

466 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Mais, a perspetiva da recorrente afigura-se inaceitável já que inadmissivelmente redutora da distinção entre meios de obtenção de prova e meios de prova porque: “Os meios de obtenção da prova são instrumentos de que se servem as autoridades judiciárias e órgãos de polí- cia criminal para investigar e recolher meios de prova; não são instrumentos de demonstração do thema probandi, não são meios de prova, são instrumentos para recolher no processo esses instrumentos. Os meios de obtenção da prova distinguem-se dos meios de prova numa dupla perspetiva: lógica e técnico- -operativa. Na perspetiva lógica os meios de prova caracterizam-se pela sua aptidão para serem por si mesmos fonte de convencimento, ao contrário do que sucede com os meios de obtenção da prova que apenas possibilitam a obten- ção daqueles meios. Na perspetiva técnico-operativa os meios de obtenção da prova caracterizam-se pelo modo e também pelo momento da sua aquisição no processo, em regra nas fases preliminares, sobretudo no inquérito. Normalmente são modos de investigação para obtenção de meios de prova e por isso que o modo de sua obtenção seja particular- mente relevante. É a esse elemento do iter probationem que aqui é prestada particular atenção. É claro que através dos meios de obtenção de prova se podem obter meios de prova de diferentes espécies, v. g. , documentos, coisas, indicação de testemunhas, mas o que releva de modo particular é que, nalguns casos, o próprio meio de obtenção da prova acaba por ser também um meio de prova. Assim, por exemplo, enquanto a escuta telefónica é um meio de obtenção de prova, as gravações são já um meio de prova. A revista e a busca são meios de obtenção da prova, enquanto permitem recolher no processo meios probatórios, mas podem ser também em si um importante meio de prova, enquanto não conduzam à descoberta e recolha de elementos indiciadores da responsabilidade e possam, atentas as circunstâncias, ser valoradas nessa perspetiva. Por isso que só tendencialmente os critérios acima referidos para distinguir os meios de obtenção de prova dos meios de prova são válidos, pois pode suceder que a distinção resulte apenas da lei ter dado particular atenção ao modo de obtenção da prova, como nos parece acontecer, v. g. , com as escutas telefónicas (…).» Tanto assim que, numa tal compreensão (dir-se-á) abrangente, cumpre distinguir os conteúdos (que são as concretas provas relevantes no juízo a final de demonstração, ou não, dos factos probandos) produto de interceção (que é o meio de obtenção de prova) objeto de transcrição (que é o meio de prova documental secundário) das comunicações intercetadas objeto da gravação em cd (que é o meio de prova digital primário) de modo que da sucessão dos conteúdos até pode resultar direta e imediatamente a demonstração de uma conduta subsumível a um verbo no modo infinitivo impessoal utilizado numa norma incriminadora para definir ou delimitar o facto ilícito objetivo como «fizer transitar» por exemplo.» (fls. 812 e 813) 2. Notificada desta decisão, a arguida arguiu a respetiva nulidade, por omissão de pronúncia, invocando o pedido de declaração de nulidade de toda a prova documental e pericial. Invocou igualmente a inconstitu- cionalidade da interpretação conferida aos artigos 414.º, n.º 2, e 420.º, n.º 1, alínea b) , do CPP, «ao equivaler a confusão conceptual à falta de motivação, recusando-se a decidir a questão, quando possuía elementos suficientes para emitir um juízo», por violação do direito de acesso à justiça (artigo 20.º da Constituição), e do direito ao recurso em processo penal (artigo 32.º, n.º 1, da Constituição). Em termos subsidiários, e caso se entendesse que o tribunal não poderia apreciar essa questão por defi- ciente e confusa motivação, invocou a inconstitucionalidade da interpretação normativa extraída daqueles preceitos legais, no sentido da rejeição do «conhecimento do pedido de declaração de nulidade de toda a prova documental e pericial por inexistência de motivação de causa de pedir coerente com tal pedido da recorrente laborado na confusão conceptual de diversas categorias jus processuais penais, sem permitir que o arguido possa vir suprir tal deficiência mediante um convite ao aperfeiçoamento», por violação dos artigos 32.º, n.º 1, 18.º, e 20.º, todos da Constituição.

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