TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

494 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL desde há mais de uma década), e, portanto, que não podia desconhecer; depois, notificada para proceder a essa autoliquidação e ao pagamento de multa, sob a cominação legal, apenas pagou esta última, sendo certo que a falha que a lei sanciona não implica que ocorra, cumulativamente, a omissão de pagamento da taxa de justiça devida e da multa correspondente; basta, assim, o não pagamento de um desses montantes ( maxime , a falta de prova do paga- mento da taxa de justiça ou da multa devidas), sendo que o pagamento de um deles é insuficiente para paralisar a consequência que a lei prevê para o reiterar da omissão (…). Ademais, contrariamente ao que a reclamante parece sustentar, da referida notificação resultava, para um destinatário minimamente atento e diligente, que eram devidos dois pagamentos: um da multa, através da guia, que expressamente referia respeitar apenas à multa; e outro da taxa de justiça em dívida, através de autoliquidação, conforme a lei claramente estipula. 7. Por conseguinte, perante o mencionado regime jurídico e o reiterado incumprimento, ou cumprimento defeituoso, pela parte, dos seus ónus processuais, a consequência afirmada/declarada no despacho do relator é obviamente imputável, única e exclusivamente, à reclamante, pois sabia, ou devia saber, que o normal tramitação dos autos, nesta fase de sua iniciativa e no seu direto interesse, dependia, necessariamente, do cumprimento do dito ónus, claramente expresso dos normativos aplicáveis e devidamente assinalado/evidenciado pelos demais interve- nientes processuais.» (fls. 171-172) 3. É na sequência desta decisão que a recorrente interpôs o presente recurso de constitucionalidade ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b) , da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei de Organização, Funciona- mento e Processo do Tribunal Constitucional, adiante referida como LTC). O recurso foi admitido por despacho de fl. 184. Subidos os autos a este Tribunal Constitucional, foi proferido despacho com fundamento no artigo 75.º-A, n. os 5 e 6, da LTC, convidando a recorrente a indicar, em termos precisos, qual a norma a fiscalizar e a peça processual em que havia suscitado a respetiva inconstitucionalidade. Respondeu o seguinte: «[…] [7. O] Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, por douto despacho do Senhor Juiz Desembargador – Relator, de 11 de fevereiro de 2014, de fls. 134, decidiu não conhecer da reclamação por não admissão dos recursos interpostos, ordenando o seu desentranhamento. 8. Ora, sobre tal despacho requereu a recorrente, em 24 de fevereiro de 2014, que recaísse acórdão, nos termos do n.º 3, do artigo 652.º do Código de Processo Civil, ex vi do n.º 4, do artigo 643.º do mesmo Código. 9. Ora, a questão da inconstitucionalidade foi levantada nesse requerimento (e só nele poderia ser suscitada), pela razão simples de que só o despacho que recusou conhecer da reclamação aplicou o n.º 2, do artigo 642.º do CPCivil, inconstitucionalizando-o, na medida em que aplicando a cominação do artigo 642.º, n.º 2, do CPCivil, impedindo o conhecimento da reclamação, violou os artigos 2.º e 20.º da CRP, negando o acesso à Justiça. 10. Na verdade, a cominação de não conhecimento da reclamação constante do n.º 2, do artigo 642.º do CPCivil que a não apresentação do documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida e da multa, determina o desentranhamento da reclamação. 11. Ora, há dois requisitos para tal cominação – o não pagamento da taxa de justiça e o não pagamento da multa e, pelo que só a falta dos dois pagamentos implica tão gravosa consequência. 12. Ora, no caso sub judice , só não foi paga a taxa de justiça, e estando em causa, como está, um efeito comi- natório e sancionatório tão drástico, não é admissível uma leitura ampliativa que leve ao desentranhamento e ao não conhecimento da reclamação. 13. Entende-se, por isso, que a leitura interpretativa e ampliativa de tal efeito cominatório, como se ambos os pagamentos não tivessem sido efetuados (ainda por cima por burocracia duplicadora) inconstitucionaliza o n.º 2, do artigo 642.º do CPCivil, nos termos referidos, por cercear o Direito à Justiça, o acesso aos Tribunais, o que a Constituição não consente, por manifesta violação do artigo 20.º da CRP.

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