TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

500 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL III – Quanto à questão de inconstitucionalidade das normas dos artigos 66.º, 77.º, n.º 4, e 78.º, n.º 4, alínea e) , da LOPTC, e do artigo 76.º do Regulamento Geral do Tribunal de Contas, está em causa nos autos a aplicação da multa prevista no artigo 66.º, n.º 1, alínea c) , da LOPTC, que se destina a sancionar o incumprimento do dever de colaboração com o tribunal, sendo uma multa de natureza claramente processual, que assume um caráter meramente instrumental em relação a um processo principal, tendo em vista, em primeira linha, garantir o cumprimento dos deveres de colaboração com o tribunal para a descoberta da verdade. IV – Constituindo as multas previstas na alínea c) do n.º 1 do artigo 66.º da LOPTC sanções de natureza processual, a sua aplicação não tem de ser rodeada das garantias de defesa atribuídas ao arguido em processo penal, não lhe sendo por isso aplicável o princípio do acusatório, uma vez que nem sequer um processo sancionatório de natureza não criminal está aqui em causa; por outro lado, constituindo este princípio uma das garantias constitucionais do processo criminal, as exigências dele decorrentes não são diretamente aplicáveis a outros tipos de processo, designadamente, aos processos previstos no artigo 66.º, n.º 1, alínea c) , da LOPTC; acresce ainda que, mesmo a admitir-se que estes processos têm uma natureza aproximada do processo de contraordenação ou de outro processo de natureza estritamente sancionató- ria (o que não se verifica), daí não decorre também que os mesmos tenham de ter uma estrutura do tipo acusatório, designadamente, por exigência do disposto no artigo 32.º, n.º 10, da Constituição. V – Conclui-se, assim, que a interpretação das normas dos artigos 66.º, 77.º, n.º 4, e 78.º, n.º 4, alínea e) , da LOPTC e do artigo 76.º do Regulamento Geral do Tribunal de Contas, no sentido de permi- tirem ao juiz a iniciativa de acusar, instruir e sentenciar nos processos de aplicação de multa a que se refere o artigo 66.º da LOPTC, não viola o princípio do acusatório, consagrado no artigo 32.º, n.º 5, da Constituição, uma vez que o procedimento aí previsto não reveste natureza sancionatória, não se encontrando sujeito aos princípios constitucionais do direito processual criminal ou do restante direi- to processual sancionatório. VI – Tendo em consideração a natureza e finalidade das sanções processuais, não se justifica aqui o peso de uma estrutura processual do tipo acusatória, não afrontando a solução da interpretação normativa aqui em análise – segundo a qual é ao mesmo juiz do Tribunal de Contas que compete a iniciativa de “acusar, instruir e sentenciar nos processos de aplicação de multa a que se refere o artigo 66.º da LOPTC” –, qualquer princípio material da justiça que informa as regras processuais gerais, não se vislumbrando que a interpretação normativa questionada viole o direito a um processo equitativo em qualquer das suas dimensões, concluindo-se ainda que não viola o princípio do acusatório, nem o direito a um processo equitativo, previstos, respetivamente, nos artigo 32.º, n.º 5, e 20.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa. VII – Quanto à invocada inconstitucionalidade orgânica da norma do artigo 76.º do Regulamento Geral do Tribunal de Contas, este artigo pertence ao Regulamento Geral do Tribunal de Contas, aprovado pelo Plenário Geral do Tribunal de Contas, ao abrigo das competências que lhe foram conferidas pela alínea d) do artigo 75.º da LOPTC, aprovada pela Assembleia da República, no exercício da sua competência reservada; por outro lado, não está aqui em causa a emissão de normas com natureza inovatória relativas à organização e competência dos tribunais, visto que a competência para aplicação das multas em causa resulta da LOPTC e não do Regulamento Geral do Tribunal de Contas, que se limita a reafirmar o que já consta daquele diploma aprovado pela Assembleia da República no uso da sua competência legislativa reservada.

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