TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

517 acórdão n.º 779/14 113. O Ministério Público interpôs recurso, nos presentes autos, para além do mais, da recusa de aplicação, por parte do Mm.º Juiz a quo , das normas contidas no artigo 76.º do Regulamento Geral [Interno] do Tribunal de Contas, por violação de lei de valor reforçado, nomeadamente do disposto no artigo 75.º, alínea d) , da Lei n.º 98/97 de 26 de agosto (Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas). 114. Uma vez que as normas cuja aplicação foi recusada não constam de ato legislativo e, por força do disposto nos artigos 280.º da Constituição da República Portuguesa e 70.º da Lei n.º 28/82 (LTC), de 15 de novembro, carece o Tribunal Constitucional de competência para conhecer de recursos de decisões dos tribunais que recusem a aplicação de normas, não constantes de atos legislativos, com fundamento na sua ilegalidade por violação de lei com valor reforçado, não deverá aquele Tribunal Constitucional tomar conhecimento, nesta parte, do objeto do recurso. 115. O n.º 8, do artigo 5.º da Lei n.º 19/2003, de 20 de junho, na redação dada pelo artigo 1.º da Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro, veio atribuir, ao Tribunal Constitucional, a competência para a fiscalização respeitante “às subvenções públicas auferidas por grupos parlamentares ou deputado único representante de um partido e aos deputados não inscritos em grupo parlamentar ou aos deputados independentes na Assembleia da República e nas assembleias legislativas das regiões autónomas, ou por seu intermédio, para a atividade política e partidária em que participem”. 116. Por sua vez, o n.º 4, do artigo 3.º, da Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro, decreta que aquela disposição tem natureza interpretativa. 117. Em ambos os casos estamos perante normas legais sediadas num diploma legislativo não dotado de valor reforçado, que regulam, por um lado, a competência do Tribunal Constitucional, e determinam, por outro, a natureza da norma de competência e o seu regime de aplicação no tempo. 118. Ora, de acordo com o conjugadamente disposto nos artigos 166.º, n.º 2, e 164.º, alínea c) , da Consti- tuição da República Portuguesa, os atos reguladores das matérias de organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional, designadamente quanto à competência, para além de se integrarem na reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República, devem, ainda, revestir a forma de lei orgânica. 119. Acontece que, conforme resulta da mera consulta da Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro, esta não reveste a forma de lei orgânica dispondo, assim, sobre matéria que só por meio desta espécie de lei de valor reforçado pode ser regulada. 120. Em face do exposto, as normas legais corporizadas no n.º 8, do artigo 5.º da Lei n.º 19/2003, de 20 de junho, na redação dada pelo artigo 1.º da Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro, ao regerem sobre matéria da competência do Tribunal Constitucional; bem como a norma contida no n.º 4, do artigo 3.º, da Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro, ao, indiretamente, dispor sobre a sua aplicação no tempo, violam a imposição constitucional resultante do disposto, conjugadamente, nos artigos 166.º, n.º 2; e 164.º, alínea c) , da Constituição da República Portuguesa, encontrando-se, assim, feridas de inconstitucionalidade formal. 121. Para a eventualidade de, assim, se não entender, dir-se-á que a norma contida no n.º 8, do artigo 5.º da Lei n.º 19/2003, de 20 de junho, na redação dada pelo artigo 1.º da Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro, aplicável retroactivamente nos termos do disposto no n.º 4, do artigo 3.º, da Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro, na reda- ção atribuída pela Lei n.º 1/2013, de 3 de janeiro, não viola materialmente o plasmado no n.º 9, do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa, uma vez que esta norma constitucional respeita às garantias do processo criminal, matéria à qual é estranha a interpretação normativa cuja constitucionalidade é questionada. 122. Todavia, tal interpretação normativa, ao ter sido configurada pelo legislador da Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro, como retroactivamente – ou no mínimo retrospectivamente – modificadora da competência para a fiscalização das contas dos grupos parlamentares/representações parlamentares, é suscetível de violar o princípio da segurança jurídica ínsito no princípio do Estado de direito democrático, plasmado no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa. 123. Já no que concerne à suposta violação do disposto no n.º 1 do artigo 214.º da Constituição da República Portuguesa, imputada às normas constantes dos artigos 23.º, 24.º, 25.º e 26.º da Lei n.º 19/2003, de 20 de junho, com a redação introduzida pela Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro, concluímos que estas não foram convocadas

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