TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

541 acórdão n.º 786/14 sacrifício do anterior titular do direito de propriedade – tomando o esquema enfitêutico unicamente como ponto de passagem para a propriedade plena. Ora, conforme referido, o direito de propriedade é garantido “nos termos da Constituição”, o que sig- nifica que, neste domínio, na formulação do Acórdão n.º 496/08, “a liberdade de conformação legislativa se encontra particularmente vinculada ao cumprimento de certos limites constitucionais: o poder legislativo está obrigado pela CRP a «conformar» a «propriedade», mas só o pode fazer nos «termos» por ela mesma definidos, ou seja, tendo em linha de conta o sistema constitucional no seu conjunto”. E, como se salientou: “[s]ervindo a fórmula (“nos termos da Constituição”) de invólucro de todos os parâmetros constitucionais integrativamente convocáveis na modelação do conteúdo e na definição dos limites, por lei, do direito de propriedade objeto da tutela constitucional, é manifesto que nela estão contidos, de forma saliente, os princípios e as opções de valor “cunhados” finalisticamente pela consecução do projeto económico, social e político da Constituição” (cfr. Joaquim Sousa Ribeiro, “O direito de propriedade na jurisprudência do Tri- bunal Constitucional”, in Relatório apresentado à Conferência Trilateral Espanha/Itália/Portugal, em outubro de 2009, p. 26, disponível no mesmo sítio da internet ). Assim, o Tribunal tem entendido que a Lei Fundamental consente, para além da privação por expro- priação ou requisição, expressamente previstas no artigo 62.º, n.º 2, da Constituição, ou outras impostas por razões de interesse público, limitações ou restrições mais ou menos profundas ao direito de propriedade, incluindo restrições resultantes de soluções dadas a conflitos de direitos, no domínio de relações jurídico privadas, com sacrifício total de uma das posições em confronto; decisivo é que tais restrições encontrem cobertura ou justificação constitucional (cfr. Acórdão n.º 491/02). Na dimensão em análise, o titular do direito de propriedade apenas goza de forma absoluta da garan- tia constitucional de não ser arbitrariamente privado dela e de ser indemnizado no caso de desapropriação (assim, J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit. , nota X ao artigo 62.º, p. 805; Acórdão n.º 215/00). 9. A admissibilidade de limitações à garantia do direito de propriedade foi versada em abundante juris- prudência deste Tribunal, da qual se destaca, pela proximidade com a questão em apreço, a proferida sobre a extinção da colonia e o direito de remição coativa do colono-rendeiro. Com uma primeira expressão ainda na Comissão Constitucional (Parecer n.º 32/92, em Pareceres da Comissão Constitucional, 21.º vol., pp. 62 e segs.) e, posteriormente, com o Acórdão n.º 1/84, seguido pelos Acórdãos n. os 14/84, 404/87, 161/90 e 204/90, foi julgada constitucionalmente admissível a privação da propriedade a favor de outro particular, por estar coberta por uma disposição expressa da lei fundamental. Pode ler-se no Acórdão n.º 14/84: «Toda a argumentação tendente a fundamentar a inconstitucionalidade das normas que estabeleceram a extin- ção da colonia, mediante a remição de um dos dois direitos de propriedade em que ela consiste, arranca da exclu- siva e isolada consideração do artigo 62.º da Constituição, sobre a garantia do direito de propriedade privada, e do entendimento de que ele só admite a perda forçada da propriedade em caso de expropriação por utilidade pública, com o sentido restrito que este conceito assume no direito infraconstitucional. Trata-se porém de uma leitura insustentável do texto constitucional. Esse mesmo preceito constitucional afirma que o direito de propriedade é garantido «nos termos da Constituição. Esta cláusula remete, diretamente, entre outras coisas, para as normas do capítulo constitucional sobre a organização económica. E é nessa sede pre- cisamente que se encontra o artigo 101.º, que na sua primitiva redação impunha a extinção da colonia e que na redação atual proíbe pura e simplesmente a sua existência. Qualquer que seja a leitura que haja de fazer-se do artigo 62.º da Constituição, quando se trate da propriedade em geral, a verdade é que, quando se trate de propriedade de meios de produção considerados nessa qualidade, o artigo 62.º abre-se às normas pertinentes da «constituição económica», entre as quais cumpre salientar, em geral, a do artigo 82.º (segundo o qual «A lei determinará os meios e formas de intervenção e de nacionalização e

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