TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

542 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL socialização de meios de produção, bem como os critérios de fixação de indemnizações») e, em particular, os artigos 101.º e 96.º do capítulo respeitante à reforma agrária. Quando se trate de matérias especificamente sediadas no âmbito da constituição económica, o artigo 62.º não é obstáculo a restrições do direito de propriedade, se nessa sede existir norma constitucional que dê cobertura suficiente a tais limitações. Ora é precisamente o que sucede no caso que nos ocupa. A necessidade – que não apenas a legitimidade! – de sacrificar a propriedade de uma das partes na colonia decorre direta e imediatamente das normas da constituição económica. Se o que caracteriza a colonia é a existência de dois direitos de propriedade (um, do senhorio, sobre o chão por desbravar; outro, do colono, sobre as benfeitorias, incluindo a obra de arroteamento), então a extinção da colonia só podia ser obtida pela unificação das duas propriedades nas mãos de um só titular (uma das partes ou, eventual- mente, um terceiro), com a necessidade de sacrificar a propriedade da outra das partes (ou de ambas no caso de a unificação se operar nas mãos de terceiro). Não existe terceira via. Foi o artigo 101.º da Constituição, ao obrigar à extinção da colonia, que exigiu, com isso, o sacrifício do direito de propriedade de uma das partes na colonia. (…) Ao afirmar-se, como acima se sustenta, que a extinção da colonia exige a unificação das duas propriedades nela envolvidas, sacrificando uma delas, está a partir-se do pressuposto de que é esse o único modo de dar cumprimento à obrigação constitucional, não havendo outra alternativa. Trata-se de um pressuposto legítimo. Com efeito, a única alternativa que poderia apresentar-se seria a con- versão da colonia em outra figura de exploração de terra alheia, designadamente o arrendamento rural. Só que tal solução não daria realização à obrigação constitucional. Por três razões fundamentais: a) Porque desse modo a colonia não seria extinta, seria apenas convertida; b) Porque com essa conversão ir-se-ia claramente ao arrepio dos princípios constitucionais que regem a reforma agrária e que privilegiam os cultivadores (como se mostrará adiante com algum desenvolvimento); c) Porque essa solução afinal implicaria a degradação da posição jurídica do colono, o qual seria expropriado da sua posição jurídica de titular de um direito real idêntico ao do senhorio, para passar a deter um simples direito de exploração de propriedade alheia. (…) Mas da Constituição não decorre, diretamente, apenas a necessidade, para extinguir a colonia, de sacrificar um dos direitos de propriedade nela envolvidos; decorre também a solução para o problema de saber qual deles é que o deve ser. Vejamos: o artigo 101.º da Constituição na sua versão originária tinha a seguinte redação: 1 – Os regimes de arrendamento e outras formas de exploração da terra alheia serão regulados por lei de modo a garantir a estabilidade e os legítimos interesses do cultivador. 2 – Serão extintos os regimes de aforamento e colonia e criadas condições aos cultivadores para a efetiva abo- lição do regime da parceria agrícola. O texto atual não diverge significativamente do primitivo, desde logo no que respeita aos elementos sublinha- dos no texto, dos quais resulta que a Constituição, nesta área, curou sobretudo dos interesses do cultivador, fazendo prevalecer os interesses do titular do direito de exploração sobre o titular do mero direito de propriedade fundiária. Da simples consideração deste preceito constitucional decorreria desde logo o entendimento de que na extin- ção da colonia (tal como na extinção da enfiteuse) a parte privilegiada seria o cultivador, ou seja o colono. Esse entendimento não é mais do que confirmado e acentuado quando se traga à colação os princípios gerais da cons- tituição económica, em geral, e os da reforma agrária, em particular. Com efeito, o artigo 101.º insere-se no título dedicado à «política agrícola e à reforma agrária» (no texto atual da Constituição), e um dos seus objetivos (o primeiro!) consta da alínea a) do n.º 1 do artigo 96.º, que se lê assim: A política agrícola tem por objetivos:

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