TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

543 acórdão n.º 786/14 a) Promover a melhoria da situação económica, social e cultural dos trabalhadores rurais e dos pequenos e médios agricultores pela transformação das estruturas fundiárias e pela transferência progressiva da posse útil da terra e dos meios de produção diretamente utilizados na sua exploração para aqueles que a trabalham. «Cultivadores», «agricultores», «aqueles que trabalham a terra»: eis os verdadeiros sujeitos constitucionais da reforma agrária configurada na Constituição. Pode pois decididamente afirmar-se que ao determinar a extinção da colonia, a Constituição dispôs implicitamente no sentido da investidura do colono-agricultor na propriedade plena da exploração agrícola, incluindo a do chão. Por conseguinte, ao atribuir em primeira linha ao colono o direito potestativo de remir a propriedade em que detém as suas benfeitorias, a legislação que extinguiu a colonia não infringiu as pertinentes normas constitucionais, antes lhe deu correto cumprimento. Tendo de sacrificar um dos direitos de propriedade envolvidos na colonia, a lei não podia deixar de seguir o critério constitucional de preferir a propriedade do agricultor, resultante do trabalho, em prejuízo da mera propriedade fundiária, simplesmente baseada na ocupação primitiva do solo do arquipélago. Se houvesse lugar a questionar algum aspeto desse regime, não seria a consagração desse direito dos colonos, mas sim aqueles casos em que ele é preterido (…)». Por sua vez, no Acórdão n.º 404/87 escreveu-se o seguinte: «Relembrar-se-á, em todo o caso, no tocante à pretensa violação da garantia do direito de propriedade, que a mesma é afastada quando se considere tal garantia, consignada no artigo 62.º da Constituição, não isoladamente, mas no contexto global da Lei Fundamental. Na verdade, se essa garantia exclui em princípio, atenta a sua mesma natureza e o seu núcleo essencial (cfr., de resto, artigo 62.º, n.º 2), a possibilidade de um particular obter coati- vamente de outro a alienação em seu favor de coisa pertencente ao primeiro (e a uma hipótese deste tipo, há de reconhecer-se, se reconduz o direito de remição em causa), ela não pode, todavia, deixar de compaginar-se com os princípios constitucionais dos quais decorrem mais ou menos extensos limites, ou a possibilidade de mais ou menos extensas restrições, ao seu conteúdo e alcance – e tais princípios dão suficiente cobertura à restrição ou limite em que se traduz o direito de remição da terra concedida ao colono-rendeiro. Por outras palavras: o direito de propriedade só se acha garantido, como se diz no próprio artigo 62.º, n.º 1, «nos termos da Constituição», mas estes «termos» autorizam aquela restrição ou limite a esse direito. Que é assim resulta logo do sentido geral das normas e princípios constitucionais relativos à reforma agrária, apontando eles, como apontam, para uma profunda «transformação das estruturas fundiárias» e para a transfe- rência progressiva da posse útil da terra para aqueles que a trabalham [alínea a) do artigo 96.º, agora do artigo 96.º, n.º 1], e resulta depois, especificamente, do artigo 101.º, n.º 2, que na sua redação primitiva determinou a extinção do regime de colonia e na atual redação o proíbe. Nesta disposição, atenta aquela ideia genérica inspi- radora da reforma agrária e a natureza das situações constituídas através do contrato de colonia, não pode, com efeito, deixar de ver-se, no mínimo, uma base constitucional bastante para o legislador conceder aos colonos- -rendeiros o direito de porem termo ao contrato de colonia através da remição da propriedade da terra onde implantaram benfeitorias, o que vale dizer, a «expropriarem» a terra em seu proveito. Que aí se verifica uma excecional restrição do direito de propriedade do senhorio é inquestionável; só que se trata, atento o que fica dito, de uma restrição que, porque «prevista na Constituição», cabe no elenco daquelas que a mesma consente, nos termos do seu artigo 18.º, n.º 2.» Igual doutrina foi seguida no Acórdão n.º 159/07, que apreciou a norma contida no n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 547/74, de 22 de outubro, que permitia ao rendeiro remir o contrato, tornando-se dono da terra pelo pagamento do preço que fosse fixado pela comissão arbitral, em casos de arrendamento rural, tendo concluído pela sua conformidade com a Lei Fundamental.

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