TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

548 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL titular do domínio direto fosse pessoa singular com rendimento inferior ao salário mínimo nacional – artigo 2.º, n.º 1 – e estabelecendo que essa indemnização consistiria no pagamento anual enquanto fossem vivas, de uma quantia em dinheiro igual a doze vezes a diferença entre o salário mínimo nacional e o seu rendimento mensal ou no pagamento do valor do foro quando este for inferior àquela quantia, violou os princípios da igualdade, da proporcionalidade, do Estado de Direito, na vertente da proteção da confiança, e violou, ainda, o direito de pro- priedade privada já que o ato ablativo do direito de propriedade não foi acompanhado de indemnização que possa ser considerada justa, mesmo em função do tempo histórico em que ocorreu. Por outro lado, e por ter atinência com a decisão, uma vez que a pretensão dos AA. assentou, também, na usucapião como modo de aquisição do domínio útil que se arrogaram, para depois, por via dele, se tornaram titu- lares do domínio útil, mesmo que não fosse de considerar a inconstitucionalidade material do diploma abolitivo da enfiteuse, este Tribunal ao abrigo do artigo 204.º da Constituição da República, por considerar materialmente inconstitucional a norma do artigo 1.º da Lei n.º 108/97, de 1[6].9. que alterou a redação do n.º 5 do Decreto-Lei n.º 175-A/96, de 16 de março, ao admitir a constituição da enfiteuse por usucapião, quando o direito já tinha sido abolido, estabelecendo assim retroactivamente um meio de aquisição do direito, sem atribuição de qualquer indemnização – artigo 62.º, n.º 2, da Constituição da República – violou os princípios da igualdade (artigo 13.º da CR), da proporcionalidade e do Estado de Direito, na vertente da proteção da confiança.» Estes dois juízos de inconstitucionalidade não se reduzem a dois argumentos diferentes para a inconsti- tucionalidade da mesma norma, como faz crer a fórmula enunciada na parte decisória do acórdão recorrido e que o Tribunal Constitucional indevidamente aceitou. Estamos perante dois juízos de inconstitucionalidade que incidem sobre normas distintas, dotadas de autonomia e com alcance diferente, apesar do nexo de instrumentalidade que as une. Na verdade, a decisão recorrida enquanto, por um lado, considera inconstitucional que a abolição da enfiteuse sobre os prédios rústicos se faça através da transferência do domínio direto para o titular do domí- nio útil, sem que se atribua, em termos gerais, ao titular do domínio direto, um direito de indemnização por essa transmissão forçada, resultando essa solução da conjugação do disposto nos artigos 1.º, n.º 1, e 2.º do Decreto-Lei n.º 195-A/76, de 16 de março, por outro lado, também censura que o direito de enfiteuse possa ser constituído retroactivamente por usucapião, conforme admitem os n.º 4 e 5 do mesmo artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 195-A/76, de 16 de março, na redação das Leis n. os  22/87, de 24 de junho (o n.º 4), e 108/97, de 16 de setembro (o n.º 5). É certo que o reconhecimento da aquisição do direito ao domínio útil por usucapião, determina o acesso automático ao direito de propriedade sobre todo o prédio, pela transmissão do domínio direto para o titular do domínio útil, mas não deixam de se tratar de duas operações jurídicas autónomas, apesar da segunda ter como pressuposto a verificação da primeira, sendo cada uma delas permitida por normas distintas. Por isso, a improcedência dos dois pedidos formulados na ação (o do reconhecimento da aquisição por usucapião do domínio útil e o da aquisição do direito de propriedade), com fundamento em inconstitucio- nalidade normativa, exigia a adoção de dois juízos distintos que aliás constam da fundamentação do acórdão recorrido, mas que não foram autonomizados na fórmula utilizada na parte decisória. Daí que tenha discordado que o presente Acórdão tenha aceite a formulação unificada como objeto de fiscalização, tendo-a julgado inconstitucional, com fundamento apenas na falta de atribuição, em termos gerais, ao titular do domínio direto, de um direito de indemnização pela transmissão forçada. Da opção por esta abordagem unitária resultou que a constituição do direito de enfiteuse por usucapião ficou também indevidamente abrangida pela decisão de inconstitucionalidade, uma vez que o fundamento desta – a falta de atribuição do direito de indemnização – não lhe é imputável, dizendo apenas respeito à norma que procede à transferência ope legis do domínio direto para o titular do domínio útil. Por esta razão, se concordei que a norma extraída do disposto nos artigos 1.º, n.º 1, e 2.º do Decreto-Lei n.º 195-A/76, de 16 de março, segundo a qual a abolição da enfiteuse sobre os prédios rústicos se faz através da transferência do domínio direto para o titular do domínio útil, sem que se atribua, em termos gerais, ao

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