TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

55 acórdão n.º 746/14 (como a manutenção de 35 horas semanais), atendendo, por exemplo, às necessidades funcionais dos serviços ou outros equivalentes. 11. Esta lei procurou, assim, concretizar aquilo que a doutrina designa como “tendências mais recentes (…) no sentido da aproximação do regime dos funcionários e agentes das entidades públicas ao regime dos trabalhadores de entidades privadas” (Cfr. Jorge Miranda/Rui Medeiros, in Constituição Portuguesa anotada, Coimbra Editora, Coimbra, 2007, p. 620). 12. Como é assinalado de forma idêntica pela mesma doutrina, esta aproximação está “patente no uso do termo “trabalhadores da Administração Pública”” nos n. os 1 e 2 do artigo 269.º da Constituição de forma equivalente ao termo “trabalhadores” utilizado no artigo 59.º da Constituição (cfr. ibidem, pp. 620-621). 13. É que, na verdade, ao Estado incumbe, nos termos do artigo 59.º, n.º 2 da Constituição, relativamente a todos os trabalhadores – quer sejam da Administração Pública quer atuem no setor privado – assegurar as con- dições de trabalho, retribuição e repouso a que os trabalhadores têm direito, nomeadamente “a fixação, a nível nacional, dos limites da duração do trabalho” [cfr. alínea b) ]. 14. Como igualmente foi reconhecido pelo Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 474/02, o artigo 59.º da Constituição “tem como destinatários todos os trabalhadores, abrangendo, também, obviamente, os trabalhadores da Administração Pública.” 15. Está em causa, por conseguinte, a definição a nível nacional dos limites da duração do trabalho. 16. Justifica-se, assim, que a proposta de lei n.º 153/XII/2.ª – que deu origem à Lei n.º 68/2013, de 29 de agosto – refira no preâmbulo que, “atenta a matéria, no âmbito do processo legislativo a decorrer na Assembleia da República devem ser ouvidos os órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas”, o que veio efetivamente a suceder, tendo sido ouvidos, no caso da Região Autónoma da Madeira, a Assembleia Legislativa e o Governo Regional (cfr. http://www.parlamento.pt ). 17. Consequentemente, pode afirmar-se que a Lei n.º 68/2013, de 29 de agosto, tem um âmbito de aplicação nacional. 18. O âmbito de aplicação nacional, que envolve a fixação dos limites da duração do trabalho e justifica a inter- venção dos órgãos de soberania, foi, aliás, reconhecido no passado pelo Tribunal Constitucional quando afirmou, no Acórdão n.º 212/92, o seguinte: “Aliás, no particular domínio da matéria em causa, resulta do disposto no artigo 59.º, n.º 2, alínea b) , da Constituição, que incumbe ao Estado assegurar as condições de trabalho, retribuição e repouso a que os traba- lhadores têm direito, nomeadamente «a fixação a nível nacional, dos limites da duração do trabalho». Independentemente da questão de saber se todos os direitos dos trabalhadores reconhecidos naquele pre- ceito (sejam dirigidos contra as entidades patronais, sejam dirigidos ao Estado) dispõem de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias (e a resposta haveria de ser certamente negativa), deve dizer-se que a fixação dos limites da duração do trabalho, no coso, a fixação das condições de prestação e dos limites quantitativos da duração do trabalho suplementar (e estas duas realidades interpenetram-se entre si), há de pertencer aos órgãos da República. ” (itálico nosso) 19. Não pode, desta forma, considerar-se que está em causa matéria de interesse específico ou, na decorrência da revisão constitucional de 2004, de âmbito regional. 20. Na verdade, o conceito de “interesse específico” ou de “âmbito regional” não pode ser entendido apenas como um conceito estático alheio, na sua predefinição, às circunstâncias do tempo. 21. Há matérias que, em dadas circunstâncias, podem assumir relevância nacional em vista de exigências de igualdade, solidariedade e unidade entre todos os portugueses, legitimando medidas de caráter geral imperativa- mente válidas para todo o território nacional. 22. É nesta linha que se pode ler, no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 613/11, que «não obstante o desaparecimento das leis gerais da república como categoria geral, não é sustentável – à luz dos fundamentos, finalidades e limites da autonomia regional enunciados nomeadamente no artigo 225.º da atual Constituição – a

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