TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

571 acórdão n.º 827/14 Para salvaguardarmos o sentido útil da questão de constitucionalidade colocada, corrigindo o referido lapso, parece-nos que se deverá entender que o objeto do recurso corresponde à interpretação normativa, extraída dos artigos 211.º, n.º 4, 212.º e 221.º, n. os 1 e 2, todos do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, conducente ao sentido que permite que, em caso de cessação de contrato no ano civil subsequente ao da admissão, o cômputo das férias ou da correspondente retribuição e subsídio, a que o trabalhador tenha direito, compreende a acumulação dos dias de férias vencidos, após seis meses completos de execução do contrato, com o direito anual de férias reportado ao mesmo ano, que se vence, em regra, no dia 1 do ano civil subsequente e com a retribuição de um período de férias, relativo ao ano da cessação, proporcional ao tempo de serviço prestado até à data da cessação. 5. O direito a férias periódicas pagas dos trabalhadores subordinados encontra consagração expressa no artigo 59.º, n.º 1, alínea d) , da Constituição da República Portuguesa. A natureza e fundamentos deste direito foram já analisados, pelo Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 52/03 (disponível e m www.tribunalconstitucional.pt , o nde poderão ser encontrados vários arestos deste Tribunal, identificados infra ), nos termos seguintes: «Este direito (que parte da doutrina tem entendido – cfr., João Caupers, in Os direitos fundamentais dos traba- lhadores e a Constituição, 1985, Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada , 3.ª edição, 318 – que, sob o ponto de vista estrutural, tem natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias) tem por finalidade, como se depara límpido, o estabelecimento de um período de descanso prolongado periodicamente estabelecido e conferido a quem, durante um apreciável decurso de tempo, presta labor a outrem, sua entidade patronal, e sem que desse período lhe seja retirada a contrapartida salarial correspondente a um trabalho que, no mesmo, não prestou. Está, assim, esse direito inquestionavelmente ligado à própria dignidade do trabalhador enquanto pessoa humana, a fim de poder desfrutar de um lapso de tempo de que poderá dispor para, inclusivamente, a par de um repouso das suas actividades profissionais, possibilitando a sua recuperação física e psíquica, se poder dedicar a acti- vidades, nomeadamente em ordem à sua «integração na vida familiar» e à sua «participação social e cultural» (cfr. Monteiro Fernandes, Noções Fundamentais de Direito do Trabalho, 1, 3.ª edição, 1979, pp. 229 e 230; cfr., ainda, citado autor, Direito do Trabalho, I – Introdução. Relações Individuais de Trabalho, 8.ª edição, 324) que, normal- mente, não poderia prosseguir devido ao trabalho que desempenha, sem que fique constrangido pela circunstância de, durante esse período, não ser remunerado. Por outro lado, tal direito deve ser perspectivado – também por razões não alheias à aludida dignidade – como uma contrapartida de um efectivo dispêndio da actividade laboral por conta de outrem que, beneficiando, como beneficia, desse dispêndio, deverá proporcionar ao trabalhador a indicada contrapartida, incluída na sua “obriga- ção” de assistência, protecção e dação de segurança ao trabalhador (autor, obra e local citados).» Em matéria de direito a férias, enquanto direito a férias periódicas pagas constitucionalmente consagrado, é reconhecido ao legislador ordinário, um amplo espaço de liberdade para, nomeadamente, definir o momento temporal em que esse direito se vence (cfr. Acórdão n.º 555/99), estabelecer os termos em que o mesmo fica dependente da prévia prestação de serviço efetivo (cfr. Acórdão n.º 52/03) ou mesmo definir a duração concreta do período de férias (cfr. Miranda, J.; Medeiros, R.; Constituição Portuguesa Anotada, 2.ª edição, Coimbra Edi- tora, Coimbra, 2010, p. 1160), desde que assegurado o conteúdo mínimo essencial do direito. Nos termos do Código do Trabalho, em regra, o direito a férias vence-se no dia 1 de janeiro de cada ano civil e reporta-se ao trabalho prestado no ano civil anterior, constituindo, por isso, um “direito de formação sucessiva e de vencimento diferido” (cfr. Amado, J. Leal, Contrato de Trabalho, Coimbra Editora, Coimbra, 2009, p. 282).

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