TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

572 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 6. Tais princípios sofrem, porém, limitações, nomeadamente nos termos do artigo 212.º, n.º 2, do Código do Trabalho, na versão que analisamos. Dispõe o referido preceito que “[n]o ano da contratação, o trabalhador tem direito, após seis meses completos de execução do contrato, a gozar dois dias úteis de férias por cada mês de duração do contrato, até ao máximo de vinte dias úteis.” Desta forma, consagra a lei, como condição do vencimento do direito a férias, o cumprimento de seis meses completos de execução do contrato. Tal condição constitui igualmente uma exceção à regra plasmada no n.º 1 do artigo 212.º do Código do Trabalho, que define que o direito a férias se vence no dia 1 de janeiro de cada ano civil. De acordo com L. Miguel Monteiro, «este “período de espera” de seis meses também condiciona o vencimento do direito a férias no ano subsequente ao da contratação. (…) [N]ão faria sentido que o direito a férias mais recente – o vencido no ano imediatamente posterior ao da contratação – se vencesse mais cedo do que o direito a férias mais antigo, referente ao ano da contratação. Assim, o trabalhador contratado em 1 de outubro tem direito a seis dias úteis de férias em virtude do trabalho prestado nesse ano, a que acresce o período de vinte e dois dias úteis vencidos no ano seguinte, não em 1 de janeiro como é regra, mas logo que perfaça seis meses completos de execução contratual. O que significa que é coincidente o momento do vencimento de ambos os direitos a férias.» (Monteiro, L. Miguel Monteiro, “Anotação ao artigo 212.º”, in Código do Trabalho , Martinez, P. Romano, 6.ª edição, Almedina, Coimbra, 2008, pp. 447 e 448). Como resulta do regime legal analisado, o ano da contratação e de início da execução do contrato mere- ceram, por parte do legislador ordinário, tratamento específico e diferenciado. Tal diferenciação – que foi herdada, no fundamental, de legislação laboral anterior – vem sendo justi- ficada, pela doutrina, com apelo ao conceito de “solução social” por visar “impedir que o trabalhador possa estar mais de um ano em situação de trabalho consecutivo” sem qualquer interrupção para gozo de férias (Assis, R., “O regime jurídico do direito a férias”, in Direito e Justiça, vol. XIV, tomo III, Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa, 2000, p. 298). Trata-se, de acordo com Leal Amado, “de um entorse introduzido no sistema, de um plus de tutela con- cedido ao trabalhador no ano em que é contratado, que não deixa, ainda assim, de suscitar algumas dúvidas quanto à sua bondade intrínseca. Isto porque, bem vistas as coisas, o trabalho prestado no ano da contratação concorre para a formação de dois períodos de férias (o desse ano e o que se vence no ano seguinte), o que não deixa de ser estranho.” (cfr. Amado, J. Leal, Contrato de Trabalho, Coimbra Editora, Coimbra, 2009, p. 285). No ano de cessação do contrato, por sua vez, face à circunstância de já se ter iniciado a formação de um novo direito a férias que, caso se mantivesse a vigência do contrato, se venceria no dia 1 de janeiro do ano civil subsequente, o legislador decidiu antecipar essa data de vencimento para o momento da cessação do contrato e reportar o direito em formação a um quantitativo correspondente ao tempo efetivo de execução do contrato, nesse ano, de acordo com uma regra de cálculo de proporcionalidade. 7. Perspetivando, isoladamente, cada uma das componentes normativas da questão colocada, facilmente verificamos que não é o vencimento antecipado do direito a um período de férias, relativo ao ano da cessação, proporcional ao tempo de serviço prestado até à data da cessação, que justifica a pertinência da questão de constitucionalidade. A este propósito, recorde-se, apenas, que toda a argumentação desenvolvida pelo recorrente, nas alega- ções respeitantes à cumulação do direito a férias relativo ao ano da cessação, e do direito a férias, resultante da celebração imediata ou quase imediata de novo contrato de trabalho com outra entidade patronal, não releva, não tendo tal dimensão integrado a ratio decidendi da decisão recorrida – nem sendo, aliás, a situação respetiva refletida na matéria de facto provada relevante para a decisão da causa, na sentença recorrida – não estando, por isso, abarcada pelo âmbito do objeto do recurso. O que torna pertinente a apreciação à luz dos parâmetros de constitucionalidade, corresponde à cumu- lação, no ano da contratação, do direito aos dias de férias vencidos, após seis meses completos de execução

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