TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

598 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Redefinida a teleologia inerente à Lei n.º 43/2005, de 29 de agosto, é mister proceder a uma (re)apre- ciação das medidas adotadas à luz do parâmetro constitucional já identificado – o princípio da proporciona- lidade em sentido amplo. 7.1.1. Como é consabido, trata-se de um princípio que releva no controlo do equilíbrio e da ponderação das medidas dos poderes públicos, fornecendo, para o efeito, uma estrutura analítica que permite lidar com as tensões entre dois direitos fundamentais ou entre um direito fundamental e um interesse público com ressonância constitucional. No modelo de matriz alemã, manifestamente predominante na jurisprudência e doutrina portuguesas, procede-se a uma análise da medida a partir de três subprincípios (triplo teste) – adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito – dotados de uma ordem lógica de aplicação (vide, entre outros, o Acórdão n.º 632/08, disponível em www.tribunalconstitucional.pt , e também Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, 4.ª edição, 2007, p. 392). Na senda do que se passa noutros ordenamentos jurídicos, a intensidade do controlo efetuado pela juris- dição constitucional reveste-se de contornos específicos quando em causa estejam as decisões do legislador. Considera-se, com efeito, que este deve beneficiar, em matérias relativamente às quais goze de elevada liberdade de conformação, de um “crédito de confiança” , de acordo com o qual “o juízo de invalidade de uma certa medida legislativa (…) se há de estribar sempre (…) em manifesto incumprimento, por parte do legislador, dos deveres que sobre ele impendem por força do princípio da proibição do excesso” (cfr., neste sentido, o Acórdão n.º 632/14, e ainda os Acórdãos n. os 484/00, 187/01 e 745/14, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt ). 7.1.2. Antes de qualquer ensaio concretizador, é conveniente tentar apurar, à luz da Constituição e da jurisprudência constitucional sobre o tema, o verdadeiro peso – abstrato e relativo – dos interesses e direitos em presença. Ora, poder-se-ia pensar que, ao determinar a suspensão da progressão nas carreiras, a Lei n.º 43/2005 estaria a comprimir o direito à retribuição, um direito de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, consagrado no artigo 59.º, n.º 1, alínea a) , da CRP. Tal raciocínio não vinga, porquanto as normas em crise não procederam a nenhuma redução do vencimento; determinaram, antes, um congelamento da progressão nas carreiras, fazendo com que um funcionário demore mais tempo a mudar de escalão, durante um período transitório. Aliás, a jurisprudência constitucional vem há muito reiterando que remuneração e progressão na carreira, apesar de intrinsecamente ligadas, não se confundem, assumindo-se como institutos autónomos (cfr. os Acórdãos n. os 261/04 e 12/12, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt ). Em jogo está, portanto, o direito à progressão nas carreiras, direito esse que este Tribunal vem inte- grando, à semelhança de alguma doutrina, no âmbito de proteção do direito de acesso à função pública (cfr. o artigo 47.º, n.º 2, da CRP), por considerar que “a permanência num posto de trabalho proporciona a especialização e o aperfeiçoamento do trabalhador”, qualidades que devem ser premiadas através de um sistema de progressão na carreira que se assume como “componente essencial de dignificação do trabalho” (vide os Acórdãos n. os 355/99 e 12/12, disponíveis e m www.tribunalconstitucional.pt , e Gomes Canotilho/ Vital Moreira, ob. cit. , p. 660). Contudo, este arrazoado não logra converter a Lei n.º 43/2005, de 29 de agosto, numa lei restritiva de direitos, liberdades e garantias, cuja validade haja de ser escrutinada à luz dos “limites” cumulativos inscritos nos n. os 2 e 3 do artigo 18.º da Constituição. De facto, como se pode ler no Acórdão n.º 355/99: «(…) Dizer que o trabalhador tem um direito à progressão na carreira não é o mesmo que afirmar que o trabalhador tem o direito à carreira tal como ela se configurava na data em que ele ingressou no seu posto. A proteção cons- titucional da carreira como fator de valorização profissional do trabalhador não impede que o legislador proceda

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=