TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

602 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL III – Quanto à questão de saber se a norma sob juízo, contida em ato legislativo, se pode configurar como norma restritiva de um direito, liberdade e garantia, de forma a que se lhe aplique o previsto na parte final do n.º 2 do artigo 18.º da Constituição, a doutrina e a jurisprudência constitucional têm sido firmes no sentido de concluir que o exercício, por parte do Estado, do poder de tributar não pode ser concebido como uma afetação ou restrição de direitos fundamentais, face à qual seja legítimo invocar o regime dos requisitos ou exigências que valem, constitucionalmente, para as leis restritivas de direi- tos, liberdades e garantias. IV – Porém, se a «conceção constitucional de tributo» – a qual inclui impostos e taxas – é inimiga de qualquer construção que veja similitudes entre estas imposições e as vulgares restrições a direitos, liberdades e garantias, tal como estas últimas são reguladas pelo artigo 18.º da Constituição, nem por isso se dispensa, quanto a elas, o requisito ou crivo da proporcionalidade, enquanto expressão de um princípio que vale em Estado de direito para todo o agir estadual, afirmação que adquire especial sentido no que às taxas diz respeito, na exata medida em que, aí, a imposição pressupõe um vínculo de sinalagmaticidade entre o que se presta (e o quanto se presta) e a utilidade privada que da prestação se retira; contudo, neste domínio, o que o Tribunal sempre disse foi que da Constituição apenas se retiraria a exigência de uma não manifesta desproporcionalidade na fixação do montante devido, dada a impossibilidade de entender o elemento estrutural da taxa (a «correspectividade» ou «sinalagmatici- dade»), como algo equivalente a uma correspondência económica estrita entre o montante a prestar e o valor da respetiva contraprestação. V – Não havendo razões para dissentir desta firme e já antiga jurisprudência e face aos elementos dispo- níveis, in casu , é impossível afirmar que existe uma manifesta desproporcionalidade entre o montante devido pelo recorrente e a contraprestação por ele obtida, contraprestação essa que se traduziu no licenciamento do posto de combustível que o mesmo recorrente economicamente explora; não estan- do estes dois elementos, que compõem o «sinalagma» próprio da taxa, relacionados entre si através dos critérios da equivalência económica, e não sendo possível determinar que o primeiro – devido ao sentido atribuído pela decisão recorrida à norma aplicada in casu – atingiu um montante tal que onera de forma excessiva a exploração económica do bem, impossível também se torna concluir que houve, por efeito da interpretação adotada pela instância, uma manifesta desproporcionalidade na fixação do montante da taxa, tanto bastando para que se não julgue inconstitucional tal interpretação, por violação do princípio da proporcionalidade. VI – Estas considerações (inclusive, no que toca à inaplicabilidade, ao caso, do disposto no artigo 266.º da Constituição), valem na íntegra para a invocada violação do princípio da justiça, decorrente também da «ideia» de Estado de direito consagrada no artigo 2.º da Constituição, pois a total ausência de elementos fácticos suficientes torna impossível suportar um juízo sobre a matéria; acresce que é discu- tível que o princípio da justiça, em si mesmo considerado, assuma relevância autónoma para efeito de controlo de constitucionalidade, discussão, porém, inútil para os presentes autos, posto que o decisivo é que não existe qualquer evidência de excesso ou injustiça resultante da interpretação normativa que foi acolhida na decisão recorrida.

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