TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

634 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL da República [cfr. artigo 165.º, n.º 1, alínea b) , da Constituição], na qual, para além do órgão parlamentar, apenas se admite a intervenção legislativa do Governo, uma vez munido da necessária autorização legislativa. Aliás, de acordo com a jurisprudência constitucional consolidada, estando em causa uma medida de imposição de condições ou requisitos substanciais de acesso a uma associação pública – in casu , a Ordem dos Psicólogos – de inscrição obrigatória para o exercício da respetiva atividade profissional (cfr. o artigo 50.º da Lei n.º 57/2008, de 4 de setembro), tal medida reveste recorte restritivo da liberdade de escolha de profis- são, estando vedada, nesse domínio, qualquer competência regulamentar autónoma da ordem profissional (cfr., neste sentido, os Acórdãos n. os 255/02, 368/03, 355/05, 3/11, 362/11, 88/12 e 89/12, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt ). C omo se lê no Acórdão n.º 89/12: «(…) A existência de um valor constitucionalmente relevante, por contraposição ao direito de livre escolha de profis- são, apenas pode justificar a imposição de restrições de índole subjetiva no acesso à profissão, e não interfere com os critérios de repartição de competência legislativa. E, assim, ainda que houvesse um fundamento bastante para o estabelecimento de condicionamentos ao exercício da atividade, essa circunstância não poderia afastar a reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República. (…)» Portanto, constituindo o setor normativo vertente matéria de reserva relativa de competência exclusiva da Assembleia da República, mesmo nas suas dimensões não restritivas – leia-se, não compressoras do âmbito de proteção do direito fundamental em causa – também as disposições transitórias criadas no sentido de acomodar a posição daqueles que até dado momento cumpriam os requisitos para o exercício de uma ativi- dade profissional deverão integrar a reserva de lei parlamentar. Com efeito, o regime transitório que obedeça àquela matriz funcional será ainda uma matéria pertencente às “políticas primárias da comunidade nacio- nal”, justificando-se plenamente a intervenção do Parlamento como uma “garantia do interesse geral contra o risco duma regulamentação de índole corporativista” (cfr. o Acórdão n.º 3/11, já mencionado). Vale isto por dizer que a previsão de um sistema de grandparenting por parte da Ordem dos Psicólogos e do seu poder regulamentar não releva para efeitos da questão de constitucionalidade que urge, na presente hipótese, apreciar. Tal regime transitório, independentemente da sua obrigação em termos materiais – que será escrutinada infra – seria sempre matéria de competência exclusiva da Assembleia da República, a insti- tuir por lei parlamentar ou por decreto-lei autorizado do Governo. Assim sendo, verdadeiramente decisivo no presente caso é perceber se, nos termos do princípio da proteção da confiança legítima dos cidadãos, a previsão de um regime transitório por parte do legislador parlamentar se configurava como um elemento indispensável para assegurar a conformidade constitucional do artigo 51.º, n.º 1, alínea b) , da Lei n.º 57/2008, de 4 de setembro, em termos de se poder abertamente afirmar que, sem um tal regime, a norma contida neste preceito não respeita as diretrizes operacionais em que se concretiza aquele princípio. 7.2. Como é consabido, o princípio da proteção da confiança assume particular conformação que faz depender a tutela da confiança dos cidadãos da verificação de quatro requisitos ou testes cumulativos. Tais “testes” foram sistematizados pelo Acórdão n.º 128/09 a partir de critérios elaborados em jurisprudência anterior (cfr., entre outros, o Acórdão n.º 287/90, disponível em www.tribunalconstitucional.pt ). Os pri- meiros testes procuram escrutinar a consistência e a legitimidade das expectativas dos cidadãos afetados por uma alteração normativa, havendo de concluir-se que aquela existe quando (1) o legislador tenha encetado comportamentos capazes de gerar nos privados expectativas de continuidade; (2) estas expectativas sejam legítimas, justificadas e fundadas em boas razões; (3) os privados tenham feito planos de vida tendo em conta a perspetiva de continuidade do comportamento estadual. O quarto teste culmina num exercício de ponderação entre interesses contrapostos, levado a cabo de acordo com o princípio da proporcionalidade em

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