TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

637 acórdão n.º 851/14 9.1. O tribunal recorrido concluiu que “a mutação da ordem jurídica com a introdução da exigência de licenciatura para o exercício da profissão de psicólogo era algo perfeitamente expectável”. Avançou, para tanto, os seguintes argumentos: «(…) Como corolário, a exigência daquela formação por banda da OPP, em conformidade com o artigo 51.º do EOP, não colide com o direito de acesso à profissão, mas antes representa a estrita aplicação de uma norma legal, que configura uma restrição admissível, porque obedece aos princípios da adequação e da proporcionalidade. Não é arbitrário ou desadequado exigir a titularidade da licenciatura correspondente para o exercício da atividade profis- sional de psicólogo. Tal exigência assenta no pressuposto, perfeitamente razoável, de quem detém essa qualificação profissional é quem apresenta competências e conhecimentos mínimos para um cabal exercício da profissão. E como se indica na decisão recorrida, a introdução da exigência da apresentação de uma licenciatura também não foi algo de totalmente inesperado, já que como se refere nos trabalhos preparatórios a criação da Ordem dos Psi- cólogos era uma ambição dos psicólogos “com mais de 20 anos, e à semelhança do que aconteceu noutros países, além de que foram sendo criados diversos cursos de Psicologia em diversas Universidades Portuguesas que foram conferindo o grau de licenciatura em Psicologia. Mesmo no ISPA o curso passou, desde 1986, a conferir o grau de licenciatura. (…)» Cumpre, em primeiro lugar, sublinhar que a previsibilidade da criação de uma associação pública repre- sentativa dos profissionais em psicologia não se confunde com a questão da previsibilidade da introdução da exigência de licenciatura em desatenção à experiência profissional daqueles que, até então, vinham exercendo a profissão de psicólogo, munidos da necessária carteira profissional. Na verdade, a história recente demonstra a existência, entre nós, de uma tradição legislativa nos ter- mos da qual a imposição de novos requisitos para o exercício de uma atividade profissional vem geralmente acompanhada de um regime transitório que permite, durante um determinado período, a inscrição em associações públicas por parte daqueles que, sem cumprir esses requisitos, vêm fazendo dessa atividade a sua profissão. Foi isso que ocorreu com os técnicos oficiais de contas (cfr. o Acórdão n.º 355/05, disponível em www.tribunalconstitucional.pt ), e também, como se viu, com os funcionários judiciais relativamente à possi- bilidade de, cessando as suas funções, virem a inscrever-se na Câmara dos Solicitadores. Por outro lado, as expectativas dos cidadãos quanto à previsão de um tal regime afiguram-se legítimas e fundadas em boas razões. A problemática inere, como já foi veiculado, a uma zona nuclear do exercício da liberdade de profissão, onde se justificam, portanto, especiais cautelas por parte do legislador quando se trata de introduzir modificações suscetíveis de retirar às pessoas a possibilidade de exercer uma profissão que razoavelmente, até aí, era o motor do respetivo salário e sobrevivência. Aquela expectativa sai, aliás, reforçada pela circunstância de as condições para o exercício da atividade profissional de psicólogo não terem sofrido quaisquer modificações desde o Despacho normativo de 1972. Daí que, admitindo até que a exigência de uma licenciatura poderia ser algo de previsível por parte daqueles que vinham exercendo a atividade de psicólogo, já não seria antecipável nem no plano dos factos, nem no plano da normatividade do sistema jurídico, que essa exigência surgisse arredada de qualquer ins- trumento de transição. Não se deteta, finalmente, que interesse público particularmente relevante pode ter determinado o alheamento do legislador parlamentar relativamente à situação dos detentores de carteira profissional de psicólogo, ao abrigo do regime anteriormente vigente. Por um lado, em face do rol de soluções alternativas à disposição do legislador (por exemplo, faculdade de inscrição tout court para os portadores de carteira profis- sional de psicólogo, consideração da experiência profissional evidenciada, realização de um exame) – algumas

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