TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

654 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL revólver. Acresce que disparou a curta distância e em direção ao tórax, onde era de esperar com maior certeza o efeito pretendido e a eficácia do disparo. Igualmente impressivo é o facto de, imediatamente após os disparos, o arguido ter proferido a expressão “aca- bou”, por pelo menos três vezes, o que traduz inegável brutalidade e forte insistência em consumar o ato. E não afasta esta conclusão o facto de também ter dito “isto é insuportável, bateu na minha tia, isto é insuportável”, atenta a enorme desproporção entre essa agressão e aquela persistência na execução do ato. Isto revela um acentuadíssimo desvalor da personalidade do arguido, suficientemente caracterizador de especial perversidade e traduzindo um grau de gravidade equivalente à estrutura valorativa dos exemplos padrão. […] O arguido foi para o encontro destinado a efetivar a visita da vítima à filha, conforme havia sido decidido pelo tribunal, com uma arma escondida. O que é que determinou o arguido a levar aquela arma completamente municiada? Confessamos que não vimos outra possibilidade que não o seu uso. Mesmo que o arguido, no momento em que decidiu levar a arma, não tenha decidido, também, matar D., seguramente que decidiu a possibilidade de usar essa arma, pois só assim se entende que a tenha levado. A certa altura esta possibilidade passou a certeza. Sobre esta situação o acórdão recorrido diz que uma vez que não se apurou que o arguido tenha tomado a deci- são de matar a vítima anteriormente a ter sacado do revólver, dado que o facto de ele se ter munido de uma arma para um encontro deste tipo não significava necessariamente que logo nesse momento tenha tomado a decisão de a vir a usar para matar, então não se podia falar em reflexão sobre os meios empregados. Concordamos com o decidido. Efetivamente os factos não permitem afirmar que a decisão de matar foi con- temporânea com a decisão de levar a arma ou quão anterior o foi relativamente à sua utilização. Socorrendo-nos do acórdão do STJ proferido no processo 508/10.0JAFUN [de 23-11-2011 relatado pelo sr. Conselheiro Souto de Moura], diremos que o modo de cometimento do crime, a motivação que a ele presidiu, a forma e a intensidade com que foi executado, a ligação que havia entre a vítima e o arguido – recordemos que tive- ram uma relação íntima, familiar, harmoniosa, durante 14 anos, que as desavenças que surgiram não se deveram a D. e que, para além de tudo, este era o pai da sua neta –, tornam este crime mais grave porque a conduta do agente é mais reprovável, isto é, a distância que separa este crime dos demais crimes de homicídio, que continuam a ser inaceitáveis, é maior porque nestes muitas vezes ocorre uma convicção de que os motivos que os determinaram eram atendíveis ou mais difíceis de resistir. Por isso, não há dúvida que o crime cometido pelo arguido reveste-se da especial censurabilidade e perversidade do n.º 1 do artigo 132.º do Código Penal. Por todas as razões apontadas no acórdão recorrido, ponderando todas as circunstâncias do caso, bem como a personalidade do agente, resulta que a gravidade do facto cometido pelo arguido equivale à gravidade dos casos mencionados nos exemplos-típicos das alíneas a) , b) , e) e j) do n.º 2 do artigo 132.º do Código Penal: a imagem global do facto é, em tudo, semelhante aos casos concretizados naquelas alíneas como justificadora da agravação; o desvalor do facto é correspondente à daqueles exemplos-padrão, derivado da especial censurabilidade e perversi- dade demonstradas pelo agente no cometimento do crime.» (fls. 7841-7842 Volume XXV). 26. Das expressões utilizadas no acórdão recorrido do STJ – parece resultar que o tribunal terá enten- dido que a conduta do autor do crime teria revelado uma gravidade equivalente à que se poderia identificar conjuntamente nos exemplos-padrão das alíneas a) , b) , e) e j) do n.º 2 do artigo 132.º do CP – e não espe- cífica e individualmente nalgum ou nalguns deles. Assim se compreende que afirme que «a gravidade do facto cometido pelo arguido equivale à gravidade dos casos mencionados nos exemplos-típicos das alíneas a), b), e) e j) do n.º 2 do artigo 132.º do CP: a imagem global do facto é, em tudo, semelhante aos casos concretizados naquelas alíneas como justificadora da agrava- ção; o desvalor do facto é correspondente ao daqueles exemplos-padrão, derivado da especial censurabilidade e perversidade demonstradas pelo agente no cometimento do crime» (itálico nosso).

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