TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

66 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL DECLARAÇÃO DE VOTO O Representante da República para a Região Autónoma da Madeira veio requerer ao Tribunal Consti- tucional a declaração de ilegalidade da totalidade das normas constantes da Resolução do Governo Regional n.º 905/2013, de 6 de setembro, por violação dos artigos 37.º, 39.º e 69.º do Estatuto Político-Administra- tivo da Região Autónoma da Madeira. O Tribunal Constitucional decidiu, no presente Acórdão, não tomar conhecimento do pedido, por considerar estar em causa uma questão de constitucionalidade, para cuja formulação o Representante da República não teria competência. Um dos motivos para a minha discordância quanto ao Acórdão é precisamente este facto. Incidindo o pedido sobre a declaração de legalidade das normas, face ao princípio do pedido (artigo 51.º, n.º 5, da LTC), não compreendo como pode o Tribunal Constitucional concentrar a sua análise na questão da constituciona- lidade do acto que é objecto do pedido, nos termos em que o faz, afastando a legitimidade do Representante da República para um pedido que não formulou. Esta opção é ainda menos compreensível se enquadrada na recente jurisprudência do Tribunal Consti- tucional. De facto, tem-se verificado uma evolução nesta jurisprudência, baseada na declaração de voto do Conselheiro Paulo Mota Pinto ao Acórdão n.º 198/00, no sentido da autonomização do vício da ilegalidade e dos pressupostos do seu conhecimento face ao pedido de fiscalização da inconstitucionalidade. Essa evolu- ção, evidenciada nos Acórdãos n. os 645/13 (no n.º 13) e 96/14 (no n.º 7), é agora posta em causa, de forma notória, pelo presente acórdão. De acordo com a assinalada declaração de voto, citada nos referidos Acórdãos, deve ser afirmada a «autonomia da força paramétrica do estatuto regional em relação à da Constituição», pelo que «a ilegalidade por violação de estatuto não pode ser reduzida apenas a um minus em relação à inconstitucionalidade, sendo sim um aliud ». De facto, a «introdução de uma norma num estatuto, pelo menos quando tal norma tem natureza ou vocação “intrinsecamente estatutária” (…), tem (…) o sentido de a autonomizar enquanto parâ- metro, também em relação ao parâmetro constitucional – que, porém, como todas as normas, aquele tem de respeitar –, se e na medida em que sejam de reconhecer diferenças de regime jurídico (…) relativamente à legitimidade para desencadear o processo de reconhecimento da sua violação». Não só a «violação de esta- tuto regional» é irredutível à «invocação de uma inconstitucionalidade», como, no âmbito da ilegalidade, «a ligação com a região autónoma e a defesa do seu estatuto político administrativo está sempre assegurada – ao contrário do que acontece com a invocação da inconstitucionalidade – pelo facto de estar em questão apenas a ilegalidade justamente por violação de estatuto regional». Para além da referida diferenciação entre a parametricidade estatutária e constitucional também não pode ser esquecido que, como referiu o Acórdão n.º 96/14, no seu n.º 7, existem «notáveis diferenças de regime entre a inconstitucionalidade e a ilegalidade por violação de estatuto, nomeadamente, a diferença res- peitante ao âmbito de legitimidade». Também estas diferenças exigem um cuidado redobrado na distinção entre as duas figuras. Por todos estes motivos, deve aceitar-se a ilegalidade com fundamento em violação do Estatuto como vício autónomo relativamente à inconstitucionalidade, com pressupostos processuais distin- tos, a analisar autonomamente. Ora, o pedido do Representante da República, incide sobre a violação dos artigos 37.º, 39.º e 69.º, todos do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, relativos à competência legisla- tiva e regulamentar da Assembleia Legislativa, bem como à competência do Governo Regional para a aprova- ção deste ato regulamentar (n. os 43-45 do pedido). Trata-se de normas que incidem sobre a divisão de tarefas entre os órgãos de governo regional, matéria que deve constar dos Estatutos. Assim, na sequência lógica da jurisprudência referida, o Tribunal Constitucional deveria tomar como legítima a questão e apreciá-la inde- pendentemente de apreciações sobre a constitucionalidade do ato em causa. É possível autonomizar o conhe- cimento da competência do Governo Regional para a emissão daquele ato, à luz do Estatuto, da questão da

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