TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

666 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL contraditório, em termos de cada uma das partes poder «deduzir as suas razões (de facto e de direito), oferecer as suas provas, controlar as provas do adversário e discretear sobre o valor e resultados de umas e outras» (Acór- dão n.º 86/88, reiterado em jurisprudência posterior e, por último, no Acórdão n.º 157/08). No entanto, como tem sido também sublinhado, o direito à prova não implica a total postergação de deter- minadas limitações legais aos meios de prova utilizáveis, desde que essas limitações se mostrem materialmente justificadas e respeitadoras do princípio da proporcionalidade. Dentro desta linha de entendimento, o Tribunal Constitucional não se pronunciou no sentido da inconstitucionalidade no tocante a diversas disposições legais que em relação a certos procedimentos jurisdicionalizados apenas admitem um específico tipo de prova (assim, os Acórdãos n. os 395/89, 209/95, 452/03; uma recensão da jurisprudência constitucional, com sucinta referên- cia à argumentação em cada caso aduzida, no já citado Acórdão n.º 157/08). Acresce – como esclarece Teixeira de Sousa – que as próprias normas de direito probatório constantes do Código Civil ou do Código de Processo Civil estabelecem certas limitações quanto aos meios de prova permi- tidos em direito, em qualquer tipo de processo e relativamente a qualquer objecto do litígio, e mesmo certas limitações quantitativas na produção de determinados meios de prova, sem que a sua constitucionalidade alguma vez tenha sido posta em causa – assim, por exemplo, os artigos 353.º e 354.º do Código Civil, sobre a eficácia e admissibilidade da declaração confessória, os artigos 393.º e 394.º do mesmo Código sobre a admis- sibilidade da prova testemunhal, e, bem assim, os artigos 632.º e 633.º do Código de Processo Civil sobre o limite de número de testemunhas a arrolar pela parte e que podem ser inquiridas por cada facto ( As partes, o objecto e a prova na acção declarativa, Lisboa, 1995, p. 228). A questão essencial que se coloca – tal como se expendeu no Acórdão n.º 646/06, que também abordou esta temática – é, pois, a de saber se, na emissão de uma norma restritiva do uso dos meios de prova, o legislador respeitou, proporcionada e racionalmente, o direito de acesso à justiça na sua vertente de direito de o inte- ressado produzir a demonstração dos factos que, na sua óptica, suportam o «direito» ou o «interesse» que visa defender pelo recurso aos tribunais. Uma resposta negativa a essa questão apenas pode perspectivar-se, neste contexto, quando se possa concluir que a norma em causa determina, para a generalidade de situações, que o interessado se veja constrito à impossibilidade de uma real defesa dos seus direitos ou interesses em conflito. 5. Revertendo ao caso concreto, não pode deixar de reconhecer-se que o regime legal decorrente da men- cionada norma do artigo 27.º, n.º 2, da Lei n.º 34/2004, ao circuncrever a prova a produzir apenas à de natureza documental, é, em regra, susceptível de garantir ao interessado a demonstração da sua situação de insuficiência económica, visto que as declarações de rendimentos a entregar perante o serviço de finanças, bem como as declarações contributivas para efeito de aplicação do regime de segurança social, que apresentam sem- pre um suporte documental, fornecerão normalmente uma indicação suficientemente precisa quer quanto à situação laboral do requerente do apoio judiciário, quer quanto ao nível dos respectivos proventos económicos. Deve notar-se, a este propósito, que a opção legislativa tem certamente por base a consideração de que os meios de prova documentais são os que se apresentam como possuindo maior eficácia e fiabilidade de que quaisquer outros e que são também os que melhor se compadecem com a natureza instrumental do processo, que tem unicamente em vista assegurar, com a necessária celeridade, que o requerente possa obter a protecção jurídica para efeito de defender os seus direitos e interesses em acção judicial. E importa igualmente reter duas outras circunstâncias: por um lado, os documentos exigíveis encontram-se ao dispor dos interessados, por res- peitarem a declarações pessoais que decorrem do cumprimento de deveres fiscais e contributivos, podendo ser obtidos, por isso, sem grande dificuldade, por outro lado – como decorre do contexto verbal do citado artigo 27.º –, o pedido de impugnação judicial pode ser formulado directamente pelo interessado, não exigindo a constituição de advogado, nem carecendo de ser articulado, podendo o impugnante limitar-se a requerer ao tribunal a obtenção da prova documental adequada (cfr. n. os 1 e 2 dessa disposição). Ou seja, embora a lei imponha a utilização de um certo meio de prova, não faz incidir sobre o impugnante o ónus processual de apresentar essa prova – ao contrário do que sucede no regime geral que decorre do Código de Processo Civil (cfr. artigos 523.º e 524.º) –, impondo antes ao tribunal um dever oficioso de a realizar, desde

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