TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

675 acórdão n.º 853/14 materialmente justificadas e respeitadoras do princípio da proporcionalidade» (vide, de novo, o Acórdão n.º 530/08, n.º 4). 10. A questão que importa resolver é, portanto, saber se uma norma que restringe o uso dos meios de prova num processo judicial respeita o direito de acesso à justiça na sua vertente de direito a demonstrar os factos que suportam o “direito” ou “interesse” que se pretende ver reconhecido pelo tribunal, ou, dito de outro modo, saber se a limitação de meios de prova estabelecida pelo legislador respeita o direito de provar os factos que suportam o pedido formulado ao tribunal. É sabido que o legislador dispõe de uma ampla margem de liberdade na concreta modelação do pro- cesso, decorrendo do que acima já ficou dito que não é incompatível com a tutela jurisdicional a imposição de determinadas limitações aos meios de produção de prova. Indispensável é, todavia, que os regimes adjetivos revelem adequação funcional aos fins do processo, devendo «conformarse com o princípio da proporcionalidade, não estando, portanto, o legislador autori- zado, nos termos dos artigos 13.º e 18.º, n. os 2 e 3, a criar obstáculos que dificultem ou prejudiquem, arbitra- riamente ou de forma desproporcionada, o direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva» (Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, tomo I, p. 190). Na verdade, a limitação em causa traduz uma restrição do direito à produção de prova ou do «direito constitucional à prova» (J. J. Gomes Canotilho, «O ónus da prova na jurisdição das liberdades: Para uma teoria do direito constitucional à prova», in Estudos sobre direitos fundamentais, Coimbra Editora, 2.ª edição, 2008, pp. 169 segs., p. 170), ínsito na garantia de acesso aos tribunais e «entendido como poder de uma parte (pessoa individual ou pessoa jurídica) ‘representar ao juiz a realidade dos factos que lhe é favorável’ e de ‘exibir os meios representativos desta realidade’». Ora, nos termos do artigo 18.º, n.º 2, da Constituição, a restrição deste direito fundamental exige que se encontre na própria Constituição (pelo menos noutros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos) base para a limitação do direito em causa, bem como que esta se limite «ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos» (não podendo, por outro lado, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo, «diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais»). Que interesses poderão, então, justificar a limitação probatória em apreciação? 11. A restrição probatória a meios documentais tem certamente por base a consideração de que estes meios de prova se apresentam como possuindo especial fiabilidade num contexto de um processo com natureza instrumental, que visa tão-só assegurar, com a necessária celeridade, que o requerente possa obter a proteção jurídica para efeito de defender os seus direitos e interesses em ação judicial própria. A opção legislativa em apreciação assenta, com efeito, na ideia de que, em sede de impugnação de deci- são da administração que negue o benefício de apoio judiciário ao requerente, admitirse a valoração de prova testemunhal poderia comprometer a verdade ou originar um protelamento excessivo do processo. E sendo assim, cumprirá então, perceber se a referida limitação probatória terá justificação razoável numa menor fiabilidade da prova testemunhal (por contraposição ao caráter mais rigoroso da prova documental), em conjugação com a necessidade de assegurar uma solução célere no âmbito do procedimento de impugnação da decisão que nega o pedido de apoio judiciário. Ora, conforme se referiu no Acórdão n.º 530/08, «(…) não pode deixar de reconhecer-se que o regime legal decorrente da mencionada norma do artigo 27.º, n.º 2, da Lei n.º 34/2004, ao circunscrever a prova a produzir apenas à de natureza documental, é, em regra, suscetível de garantir ao interessado a demonstração da sua situação de insuficiência económica, visto que as declarações de rendimentos a entregar perante o serviço de finanças, bem como as declarações contributivas para efeito de aplicação do regime de segurança social, que apresentam sempre um suporte documental, fornecerão normalmente uma indicação suficien- temente precisa quer quanto à situação laboral do requerente do apoio judiciário, quer quanto ao nível dos

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