TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

692 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 6.2. Entendeu o tribunal a quo que, com a concessão dos benefícios fiscais apontados, pretendera o legislador estimular a “instalação” de empreendimentos de utilidade turística, e não também o chamado “turismo residencial”, ou seja, a (primeira) aquisição de frações (no caso de empreendimentos turísticos em propriedade plural) para cedência da exploração com participação nos resultados da mesma. Desde já se avança que a interpretação normativa perfilhada no acórdão recorrido não merece censura do ponto de vista jurídico-constitucional. Como esclarece o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de dezembro, o instituto da utilidade turística afigura-se um instrumento crucial para o “desenvolvimento do setor”, em particular no que respeita a equipamento hoteleiro ou similar. Por conseguinte, os benefícios fiscais concedidos no artigo 20.º, n.º 1, do diploma, acham-se funcionalmente adstritos ao desenvolvimento do setor turístico português, sobretudo a nível imobiliário e de equipamentos. Encarado desta perspetiva, poder-se-ia pensar que o tratamento fiscal vantajoso deveria dirigir-se a todos aqueles que, com o seu investimento, promovessem o setor turístico imobiliário. Contudo, visto que os benefícios fiscais constituem inevitavelmente “despesa fiscal”, isto é, constituem um pagamento implícito feito, a título excecional, pelos poderes públicos por intermédio da redução dos impostos a pagar, o legisla- dor procurou diferenciar os beneficiários desse favorecimento fiscal em função de um juízo sobre a maior ou menor intensidade do seu contributo para a consecução daquele escopo. Concedeu, assim, a isenção de IMT e a redução de IS aos adquirentes de prédios ou frações autónomas com destino à “instalação de empreen- dimentos de utilidade turística” – entenda-se, aos responsáveis pela projeção, licenciamento e construção do empreendimento para fins turísticos – excluindo, portanto, aqueles que se dedicam ao “turismo residencial”, ou seja, aqueles que, como consumidores finais, investem num produto turístico posto no mercado, ocu- pando as unidades de alojamento e celebrando contratos de cedência de exploração sobre elas (cfr. os artigos 45.º e 52.º e segs. do Regime Jurídico da instalação, exploração e funcionamento dos empreendimentos turísticos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 39/2008, de 7 de março, entretanto alterado pelo Decreto-Lei n.º 15/2014, de 23 de janeiro). Esta diferenciação não se afigura arbitrária ou desrazoável, verificando-se uma conexão racional mínima entre o critério mobilizado – o da intensidade do contributo para o desenvolvimento do setor turístico imo- biliário – e o objetivo subjacente ao diploma legislativo, que é, como vimos, o de fomentar e estimular aquele desenvolvimento através do instituto da utilidade turística. De facto, não há dúvida de que tanto aqueles que instalam as unidades turísticas, como aqueles que adquirem (em primeira mão) ou exploram os produtos imobiliários, estão a investir, direta ou indiretamente, no setor e, nessa medida, a promovê-lo. Como se lê no acórdão do STA, de 23 de janeiro de 2013, citando a doutrina nacional, a possibilidade de alienar a pro- priedade do ativo imobiliário permite ao promotor aliviar o investimento realizado à cabeça, diminuindo a imobilização do capital e os encargos financeiros a ele associados. É, porém, evidente que a situação de uns e outros não é idêntica à luz do tertium comparationis adotado pelo legislador. A criação de empreendimentos turísticos não se confunde com a aquisição de frações em empreendimentos já instalados, quer a aquisição seja concretizada em planta, quer depois de instalado ou construído o empreendimento. A atuação do promotor do empreendimento reveste, pelo tipo de atividades e responsabilidades assumidas, uma magnitude propulsora que não tem paralelo na dos (ainda que primeiros) adquirentes de frações autónomas em aldeamento turístico. Destarte, não cabendo a este Tribunal substituir-se ao legislador quanto àquilo que seria a solução justa e oportuna, há que reconhecer que a opção diferenciadora por este adotada se mostra racionalmente creden- ciada atento o escopo do regime jurídico em que se insere, não se detetando, por isso, violação dos artigos 13.º e 104.º, n.º 3, da Constituição. 8. Depois, considerando objeto de controlo do nosso modelo de justiça constitucional – que incide, como é consabido, sobre normas jurídicas ou segmentos normativos de um determinado preceito

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