TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

703 acórdão n.º 857/14 hh. Nos termos em que se encontra formulado o texto Constitucional, uma vez que não prescreve que as leis formais se devem, em princípio, limitar à aprovação das bases gerais dos regimes jurídicos, as normas complementares das leis-quadro deveriam assumir, não a forma de regulamento, mas a de decreto-lei (de desenvolvimento), bastando atender para à parte final do artigo 115.º n.º 5 da CRP para constatar que, do mesmo preceito, resulta, clara e expressamente, a proibição de regulamentos modificativos, suspensivos ou revogatórios das leis. ii. Assim, os artigos 42.º e 62.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis e regulamento em causa, baseado naqueles, violam os princípios da preeminência e tipicidade dos atos legislativos e da hierarquia normativa em matéria fiscal, porquanto: i) a força e valor de lei não estão na disponibilidade do legislador (é a Constituição e não a lei que estabelece a hierarquia normativa), e ii) a Constituição admite apenas decretos-leis autorizados e não regulamentos (artigo 168.º, n.º 2 CRP). jj. Com a revisão constitucional de 1982, foi aditado o referido n.º 5 do artigo 115.º, onde se estabeleceu que «Nenhuma lei pode criar outras categorias de atos legislativos ou conferir a atos de outra natureza o poder de, com eficácia externa, interpretar, integrar, modificar, suspender ou revogar qualquer dos seus preceitos.» – pelo que deixou de ser lícito sustentar a normação regulamentar nestes campos. kk. Devem, assim, ter-se como inconstitucionais, por violação do disposto nos artigos 103.º n.º 2, 119.º n.º 1 h) , 165.º n.º 1 i) e 198.º n.º 1 b) da CRP, os artigos 42.º e 62.º CIMI, quando interpretados no sentido de que não é necessário um ato legislativo que fixe zonamentos nos mesmos referidos, e o concreto coeficiente de localização a aplicar aos prédios neles localizados. ll. A lei, embora sem quaisquer diretrizes quanto à metodologia a utilizar, habilita a CNAPU a propor os zonamentos e coeficientes de localização, que, posteriormente, serão aprovados por Portaria do Ministro das Finanças – pelo que, caso se entenda que a lei se limita a tornar dependente de regulamentação determi- nado aspeto, que deixa em aberto, surge a questão de saber se a lei, ao remeter a definição de determinado quadro legal para um regulamento, o pode fazer em termos tão abrangentes (sobretudo considerando que estamos no campo das normas de determinação de valores tributáveis). mm. A Lei reenviante está sujeita aos limites constitucionais da reserva de lei, não podendo demitir-se da regu- lamentação do “núcleo essencial” das matérias e da fixação de critérios disciplinadores básicos – sendo que, como exaustivamente demonstrado, no caso concreto não existe qualquer definição dos critérios discipli- nadores básicos para a fixação, por Portaria, dos zonamentos e coeficientes de localização, supostamente aprovados pelo CNAPU, e concretamente aplicados nas avaliações imobiliárias para efeitos fiscais nn. A lei limita-se a estabelecer, no artigo 42.º do CIMI algumas características a ter em conta na determina- ção do coeficiente de localização, de modo meramente exemplificativo, sendo certo que da lei não consta: a quantificação de cada uma dessas características determinantes do coeficiente de localização; a indicação acerca do peso de cada uma; a metodologia própria para a determinação do coeficiente de localização. oo. Sempre que a lei habilita a administração a complementar ou executar os seus preceitos, tal não significa transformar o regulamento em lei – «Daí que: (a) a norma regulamentar executora ou complementar con- tinue a ser uma norma separada e qualitativamente diferente da norma legal, pois a norma legal reenviante não incorpora o conteúdo regulamentar nem lhe pode atribuir força legal; (b) ambas as normas mante- nham a natureza e hierarquia respetivas, não se verificando qualquer fenómeno de integração. [É uma prática incorreta e inconstitucional do legislador quando certas leis consideram os regulamentos executivos ou complementares como “parte integrante da lei”] (…)» . pp. No caso dos autos, constata-se que o artigo 42.º n.º 2 e 3 a) , b) e c) do CIMI não define o núcleo essen- cial da determinação dos coeficientes de localização – como relevante parâmetro para a avaliação fiscal do património imobiliário – sendo que a concretização da quantificação e qualificação dos critérios legais para definição dos coeficientes de localização, também não goza de previsão expressa nem na lei, nem na própria Portaria que supostamente os aprova.

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