TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

715 acórdão n.º 858/14 Tendo o recurso prosseguido para apreciação de mérito, o recorrente apresentou alegações em que for- mula as seguintes conclusões: «[…] I. O recurso sub judice destina-se, salvo melhor opinião, a apreciar a constitucionalidade das normas constantes nos artigos 26.º, n.º 1, alínea c) e 35.º, n.º 2 do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública, aprovado pela Lei n.º 7/1990, de 20 de fevereiro; II. A Constituição da República Portuguesa funda-se no princípio da dignidade da pessoa humana (artigo 1.º), o qual é reconhecido por este tribunal constitucional, na esteira da comissão constitucional (cfr. Acórdão n.º 479, Boletim do Ministério da Justiça, n.º 327, junho de 1983, p. 424 e segs.), impondo a satisfação de um mínimo necessário para que cada pessoa tenha uma existência condigna; III. Essa existência condigna pressupõe a existência de um rendimento mínimo destinado a fazer face às mais elementares necessidades básicas, nomeadamente alimentação; IV. A perda do direito à pensão, ainda que delimitada a um hiato temporal de 4 (quatro) anos, constitui indubi- tavelmente uma restrição intolerável face ao princípio da dignidade humana e, bem assim, uma privação in totum dos meios de subsistência do recorrente; v. a manutenção da perda do direito à pensão, ainda que por quatro anos, coloca em causa a dignidade e a sobrevivência do recorrente, o qual não dispõe de outros meios que assegurem a sua subsistência, não pode solicitar qualquer apoio social (por ser beneficiário da caixa geral de aposentações) e foi aposentado na sequência de uma doença invalidante, a qual impede-o de trabalhar; VI. A situação em apreço (aposentado por doença invalidante), por força do princípio da dignidade humana, não pode ser equiparada a uma situação de despedimento pois que, neste caso, o sujeito da pena disciplinar, embora veja extinto o vínculo à Função Pública, não padece de doença invalidante e continua a ter condições de trabalhar e de prover ao seu sustento; VII. Em consequência, in casu , não pode deixar de ser considerada desproporcionada e violadora do princípio da dignidade humana a aplicação de uma sanção de perda de aposentação a um aposentado por doença invali- dante, como é o caso do recorrente; VIII.Deve, pois, considerar-se inconstitucional, por violação do princípio constitucional do respeito pela dignida- de humana, corolário do princípio do estado de direito democrático, enunciado no artigo 2.º da constituição da república portuguesa, com afloramentos nos números dois e três do artigo 26.º daquela Lei Fundamental, a interpretação e aplicação das normas contidas nos artigos 26.2, n.º 1, alínea c) e 35.º, n.º 2 do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública, aprovado pela Lei n.º 7/1990, de 20 de fevereiro, no sentido de que admitem a aplicação da sanção de perda de aposentação a funcionários da polícia de segurança pública que tenham sido aposentados por doença invalidante; IX. O ora recorrente considera igualmente que, com a entrada em vigor da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro e ainda com a entrada em vigor da Lei n.º 58/2008, de 9 de setembro, a sanção de perda do direito à aposen- tação, pelo período de quatro anos, que lhe foi aplicada tornou-se inconstitucional, pelo menos a partir do dia 1 de janeiro de 2009, por violação dos princípios da igualdade e da proporcionalidade; X. A entrada em vigor do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas adotou o prin- cípio juslaboral que prescreve que o empregador só tem poder disciplinar sobre o trabalhador que se encontre ao seu serviço. Tal estatuto foi aprovado pela Lei n.º 58/2008 que impõe, no seu artigo 4.º, n.º 8, que cessa imediatamente a execução das penas e a produção dos respetivos efeitos que se encontrem em curso relativa- mente a trabalhadores aposentados, desde que não tenham constituído nova relação jurídica de emprego; XI. O digno magistrado do ministério público, no âmbito do douto parecer que antecedeu o acórdão recorrido (cfr. documento n.º 1 que ora se junta) considerou, desde logo, que porém, a evolução do direito discipli- nar sancionatório disciplinar decorrente da Lei n.º 52/2008 não pode deixar de impor nova reflexão sobre a matéria. na verdade, conquanto o recorrente esteja sujeito a um estatuto disciplinar especial, excluído da aplicação subjetiva do estatuto aplicado põe aquela Lei (artigo 1.º, n.º 3), nada parece justificar a diferença de

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