TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

717 acórdão n.º 858/14 XXI. Denote-se que o conjunto de fatores de discriminação indicados no n.º 2 do artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa não tem um caráter exaustivo, pelo que são igualmente ilícitas as diferenciações de tratamento fundadas em outros motivos que sejam contrários à dignidade humana, incompatíveis com o princípio do estado de direito democrático ou arbitrários; XXII. Ora, conforme salienta este venerando Tribunal Constitucional, “na verdade, o princípio da igualdade, enten- dido como limite objetivo da discricionariedade legislativa, não veda à Lei a adoção de medidas que estabe- leçam distinções. Todavia, proíbe a criação de medidas que estabeleçam distinções discriminatórias, isto é, desigualdades de tratamento materialmente não fundadas ou sem qualquer fundamentação razoável, objetiva e racional. O princípio da igualdade, enquanto princípio vinculativo da Lei, traduz-se numa ideia geral de proibição do arbítrio. No mesmo sentido, o que importa é que não se discrimine para discriminar”; XXIII.Assim, a aplicação do artigo 26/1/ c) do RD/PSP importa a violação do princípio constitucional da igualdade, por falta de fundamento material diferenciador. que possa justificar racionalmente a diferença de tratamento relativamente à generalidade dos trabalhadores que exercem funções públicas (…) no caso, uma tal diferen- ciação, ainda que pudesse encontrar alguma justificação na especialidade do estatuto da PSP, quando pro- porcional a essa especialidade (e não encontra), claramente «ultrapassa os limites da proibição do excesso em termos de igualdade proporcional» – conforme acórdão citado, conforme defendido e pugnado pelo digno magistrado do ministério público, no âmbito do douto parecer que antecedeu o acórdão recorrido; XXIV. Para o efeito, o digno magistrado do ministério público socorreu-se do douto acórdão deste Tribunal Consti- tucional (n.º 353/2012), o qual sustenta que: a igualdade jurídica é sempre uma igualdade proporcional, pelo que a desigualdade justificada pela diferença de situações não está imune a um juízo de proporcionalidade. a dimensão da desigualdade do tratamento tem que ser proporcionada às razões que justificam esse tratamento desigual, não podendo revelar-se excessiva; XXV. Aqui se invoca precisamente e com o maior respeito o doutíssimo entendimento ali perfilhado; XXVI.Inexistindo fundamento material diferenciador que justifique a diferença de tratamento dos aposentados da polícia de segurança pública relativamente à generalidade dos aposentados da Função Pública, impõe-se que as normas contidas nos artigos 26.º, n.º 1, alínea c) e 35.º, n.º 2 do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública, aprovado pela Lei n.º 7/1990, de 20 de fevereiro, sejam consideradas inconstitucionais por violarem os princípios constitucionais da igualdade e da proporcionalidade.» O Ministério da Administração Interna contra-alegou, concluindo do seguinte modo: […] 1. Quanto à alegada violação do respeito da dignidade humana, refere-se no acórdão proferido no recurso n.º 1058/06, disponível no sítio da DGSI, “(…) uma pena de privação de uma pensão de aposentação (…) pode vir a afetar as condições mínimas de subsistência do seu destinatário, mas o certo é que também o pode a pena de demissão de um funcionário no ativo, ou mesmo a pena de inatividade por período longo, já que igualmente lhe corresponde perda total da remuneração, de modo definitivo ou temporário. E pode bem acontecer que o desti- natário dessa pena não lenha outros meios de subsistência, nem possibilidade de os angariar. Teríamos então de considerar inconstitucional qualquer pena disciplinar que privasse o seu destinatário de um mínimo de subsistência durante um período longo de tempo, o que não parece razoável, pois estamos no campo do direito sancionatório disciplinar, que à semelhança do direito criminal, é eticamente fundado, na medida em que protege valores de obe- diência e disciplina, no quadro de um serviço público, necessários para o seu perfeito funcionamento e, portanto, visa também dar satisfação a um interesse público de punir (e não só prevenir) as infrações violadoras de determina- dos deveres funcionais, não sendo, portanto, sua finalidade assegurar aquele mínimo de subsistência aos infratores. 2. Não fará sentido pensar que, o agente da autoridade que foi condenado por sentença transitada em julgado, pela prática de um crime de prevaricação e denegação de justiça, p. e p. pelo artigo 369.º, n.º 4 do CP, na pena

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