TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

755 acórdão n.º 657/14 recaia o ónus de explicitar os fatores, objetivos, que possam conduzir o tribunal a aceitar uma tal conclusão. É assim insuficiente afirmar, de modo conclusivo, que a aplicação da norma foi inesperada ou surpreendente, se não se aponta com o necessário rigor quer a formulação da interpretação normativa usada, quer a razão pela qual, em atenção à fase processual verificada, foi impossível ao interessado suscitar atempadamente a questão. Na verdade, a jurisprudência do Tribunal tem vincado que «só em casos excecionais e anómalos» em que o recorrente não dispôs processualmente da possibilidade da suscitação atempada da questão é que será «admissível» a arguição em momento subsequente (Acórdãos n. os 62/85, 90/85 e 160/94 in Acórdãos doTribunal Constitucional, 5.º Vol., pp. 497 e 663 e Diário da República , II Série, de 28 de maio de 1994) o que faz recair sobre o recorrente o dito ónus de expor, com a devida concretização, as circunstâncias pelas quais lhe foi impossível suscitar a questão de forma adequada». Mesmo na hipótese de se admitir que a reclamação para a conferência seria ainda o momento processual adequado para o recorrente cumprir esse ónus – questão que o Tribunal Constitucional não tem aqui que decidir – a verdade é que, na própria reclamação apresentada, o reclamante não oferece qualquer justificação para a impossibilidade de ter suscitado a questão previamente, articulando razões para sustentar a natureza imprevisível da interpretação normativa feita pela decisão recorrida cuja conformidade com a Constituição pretenderia ver sindicada. Com efeito, embora, por remissão para o teor do requerimento de interposição do recurso de constitu- cionalidade, venha invocar jurisprudência do Tribunal Constitucional alegadamente em sentido contrário à posição assumida pelo Supremo Tribunal de Justiça, o reclamante não questiona que a interpretação acolhida corresponde àquele que tem sido o sentido da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, não referindo, aliás, qualquer acórdão desse tribunal em sentido contrário. Aliás, como bem observa o Exm.º Magistrado do Ministério Público no Tribunal Constitucional, «[…] mesmo que houvesse acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça em sentido divergente, tal não levava a que a interpretação acolhida fosse de considerar insólita ou inesperada, porque, havendo acórdãos anteriores, ela seria sempre uma das interpretações passíveis de ser adotada». É de concluir, pois, que, não só o reclamante não cumpriu o ónus que sobre ele recai de expor, com a devida concretização, as circunstâncias pelas quais lhe foi impossível suscitar a questão de forma adequada, o que só por si seria suficiente para indeferir a presente reclamação, como, no caso dos autos, jamais seria de entender que se estaria perante uma situação em que a interpretação acolhida pela decisão recorrida seria de considerar excecional ou insólita, em termos de ser desrazoável a exigência de que o recorrente a tivesse antecipado. Assim, por não ter sido dado cumprimento ao ónus de suscitação prévia, de modo processualmente adequado, da questão de constitucionalidade perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, tal como é exigido pelo n.º 2 do artigo 72.º da LTC, não é de admitir o recurso interposto para este Tribunal. III – Decisão 6. Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide indeferir a presente reclamação, confirmando o despacho reclamado que não admitiu o recurso. Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta. Lisboa, 14 de outubro de 2014. – Maria Lúcia Amaral – José Cunha Barbosa – Maria de Fátima Mata- -Mouros (vencida nos termos da declaração junta) – João Pedro Caupers (vencido nos termos da declaração em anexo) – Joaquim de Sousa Ribeiro.

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