TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 91.º Volume \ 2014

756 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL DECLARAÇÃO DE VOTO Ficámos vencidos. Votámos o deferimento da reclamação e a consequente admissão do recurso.  1. O recurso de revisão constitui um meio extraordinário de reapreciação de uma decisão transitada em julgado e tem como fundamento principal a necessidade de se evitar uma sentença injusta, de reparar um erro judiciário, por forma a dar primazia à justiça material em detrimento de uma justiça formal. Subjaz-lhe o propósito de repor a verdade e a justiça. 2. Um dos fundamentos do recurso de revisão é a existência de novos factos [artigo 449.º, n.º 1, alínea d) , do Código de Processo Penal (CPP)], isto é, de factos cuja existência era ignorada ao tempo do julgamento, que nele não foram valorados por serem desconhecidos do tribunal. É ainda necessário que tais factos provo- quem grave dúvida sobre a justiça da condenação. No caso, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu que a «contraditoriedade entre as declarações prestadas na audiência de julgamento do processo de condenação e as prestadas no processo de cooperação internacional, estas, ao contrário daquelas, no sentido de afastar a responsabilidade do requerente pelo crime, são, efetivamente, adequadas a criar dúvidas sobre a fidedignidade das prestadas em audiência de julgamento e abalar a convicção de certeza do tribunal adquirida com base nelas». Todavia, negou a revisão pedida, por não haver factos ou meios de prova novos a considerar. 3. O despacho reclamado não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional com fundamento na falta de suscitação prévia da questão de constitucionalidade que integra o seu objeto, por «a interpretação das normas da alínea d) do n.º 1 do artigo 499.º do CPP, constante do Acórdão, corresponde[r] a jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal de Justiça». Se assim é, de acordo com este raciocínio, deveria ter o reque- rente suscitado em momento anterior ao da pronúncia do STJ a questão de constitucionalidade. É, com efeito, conhecida a jurisprudência do STJ no sentido de entender que a alteração do depoimento de uma testemunha prestado em julgamento não constitui facto novo e que a eventual falsidade desse depoi- mento só é atendível (para efeitos de revisão da sentença) depois de a falsidade desse meio de prova ter sido reconhecida por sentença [artigo 449.º, n.º 1, alínea a) , do CPP]. 4. No presente caso, porém, estamos perante declarações de arguido (não, depoimentos ajuramenta- dos), que se apresentam como contraditórias com as prestadas em julgamento e que foram produzidas em momento anterior (e não posterior) à realização do julgamento. O elemento desacreditador do declarante não sucede, pois, ao julgamento, antes antecede o mesmo. As declarações de sentido divergente às prestadas por um co-arguido no julgamento constituíam um facto já verificado no passado, ainda que desconhecido do tribunal. Ora, estas particularidades do caso conferem-lhe originalidade quando confrontado com os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça que se debruçaram sobre a verificação do pressuposto de admissibilidade do recurso de revisão previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 449.º do CPP. E sendo assim, não se vê como possa afirmar-se a adequada e normal previsibilidade da aplicação nor- mativa adotada no caso em apreço em ordem a exigir ao interessado a suscitação, logo perante o tribunal recorrido, da questão de constitucionalidade que ela coloca. 5. Só perante cada caso se pode averiguar das circunstâncias particulares em que surge a questão de constitucionalidade, sendo que o cumprimento ou incumprimento do requisito da suscitação prévia se há-de analisar ainda à luz de uma tramitação normal do processo.

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