TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015

101 acórdão n.º 576/15 No caso das empresas de capitais maioritariamente públicos reclassificadas dentro do perímetro das Administrações Públicas, os riscos relevantes para o Orçamento do Estado decorrem, assim, da sua própria atividade, na medida em que, por efeito da sua reclassificação, tais empresas passam a integrar o perímetro das Administrações Públicas em Contas Nacionais, passando a financiar-se junto do Estado, através do respetivo Orçamento. Para além disso, quer os respetivos resultados operacionais, quer a respetiva dívida encontram-se refletidos na conta das Administrações Públicas, projetando-se, por essa via, na mensuração da dívida pública. 16. A integração no universo do Orçamento do Estado das empresas de capital maioritariamente público já reclassificadas, na medida em que determina a automática projeção da situação financeira que apresentem sobre o apuramento do défice e da dívida pública, torna evidente, do ponto de vista da relação de adequação medida-fim, o mecanismo indireto de reporte seguido pelo legislador ordinário. Na verdade, relativamente a estas empresas, o estabelecimento de uma relação de adequação funcional entre o incremento da respetiva autossustentabilidade financeira e o equilíbrio orçamental do Estado resulta, à partida, dos próprios efeitos da reclassificação. Ao contrário do que sucede com as empresas de capital maioritariamente público já reclassificadas, as empresas de capital maioritariamente público não reclassificadas não se encontram integradas no perímetro das Administrações Públicas em Contas Nacionais, não beneficiando por isso da transferência direta para o Estado dos respetivos passivos e demais responsabilidades. Apesar de assim ser, existe, no entanto, um conjunto de elementos com base nos quais é possível esta- belecer, mesmo em relação a estas empresas, uma conexão suficientemente credenciável entre o saneamento contabilístico do setor público empresarial e o processo de consolidação orçamental para, pelo menos num controlo de evidência, inviabilizar a possibilidade de considerar destituída de fundamento – e por isso para aquele efeito inadequada ou imprestável − a ponderação subjacente à decisão de sujeitar os respetivos traba- lhadores à redução salarial imposta para os anos de 2014 e 2015 no artigo 2.º da Lei n.º 75/2014, de 12 de setembro, sem a concomitante imposição da obrigação de entrega nos cofres do Estado dos valores corres- pondentemente deduzidos. 17. Conforme este Tribunal já teve ocasião de afirmar, em relação ao universo das “empresas públicas não reclassificadas” – e, consequentemente, também das empresas de capital maioritariamente público não reclassificadas –, “a apresentação de resultados líquidos negativos” não é, desde logo, “indiferente para o esforço financeiro do Estado (assim como de qualquer outro investidor público) nas suas empresas. Com efeito, ocorrendo tal circunstância, não é só a impossibilidade de distribuir dividendos que está em causa. À mesma acresce, por via dos resultados transitados, a diminuição do capital próprio da empresa e a con- sequente necessidade de compensação, seja por via do endividamento, seja pela via do reforço de capital. Qualquer uma destas vias importa, a prazo, despesa pública, efetiva (dotações de capital, conversão de crédi- tos ou assunção de passivos) ou potencial (concessão de garantias a terceiros pelo financiamento concedido à empresa)», sendo também essa «a razão justificativa do instituto da “perda de metade do capital” previsto no artigo 35.º do Código das Sociedades Comerciais» (cfr. Acórdão n.º 413/14). Segundo igualmente notado no referido aresto, acrescem a tal circunstância as consequências associáveis ao risco de reclassificação de novas entidades do setor público empresarial em consequência da entrada em vigor do sistema europeu de contas 2010 («SEC 2010»). Tal risco começou por ser identificado no Rela- tório do Orçamento do Estado para 2014, onde se escreveu, a este propósito, o seguinte: «É de referir que se prevê a entrada em vigor da atualização do Sistema Europeu de Contas Nacionais e Regionais (o desig- nado SEC 2010) (…) em 2014, e que os seus efeitos irão retroagir, em termos de séries estatísticas, a 2010. Uma alteração fundamental incide sobre a forma de apuramento do “Critério da Mercantilidade”, o que poderá implicar a inclusão de um número adicional de empresas públicas no perímetro de consolidação das

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