TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015

140 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL n.º 2 do artigo 15.º da Lei n.º 68/93, na redação conferida pela Lei n.º 72/2014, que também a deliberação sobre o arrendamento apenas produzirá efeitos se for aprovada por uma maioria qualificada de dois terços dos membros presentes. A última decorrência resultante da ampliação dos títulos com base nos quais passou a ser admitida a cedência do gozo dos baldios a terceiros foi a de conferir legitimidade aos arrendatários e cessionários para requerer a declaração de nulidade dos atos ou negócios jurídicos de apropriação ou apossamento do baldio, bem como da sua posterior transmissão [cfr. artigo 4.º, n. os 1 e 2, alínea d) , da Lei n.º 68/93, na versão resul- tante da Lei n.º 72/2014]. Apesar de o objeto de ambos os pedidos formulados compreender, ainda que sob diferentes constela- ções, a globalidade das normas acima referidas, é patente que as questões de constitucionalidade suscitadas se prendem com a norma, constante do n.º 1 do artigo 10.º, que modifica o regime de cedência do uso e fruição do baldio a terceiros, sendo as demais normas questionadas a título meramente derivado ou consequencial. 24. Confrontando as duas figuras contratuais com recurso às quais é atualmente admitida a cedência a terceiros do uso e a fruição dos terrenos baldios – cessão de exploração e arrendamento, rural ou para outros fins –, verifica-se ser comum a ambas a existência de uma transferência de tipo oneroso e caráter temporário daqueles bens comunitários com vista ao aproveitamento dos recursos dos respetivos espaços rurais, radi- cando o elemento diferenciador fundamental na circunstância de, no arrendamento, o locador transferir para o locatário o direito de gozo do prédio rústico nu, e na cessão de exploração essa transferência ter por objeto a fruição de uma unidade económica, mais ou menos complexa, que se apresenta como um bem a se e da qual o prédio constitui apenas um dos respetivos elementos componentes. Por assim ser, a cessão de exploração, ao contrário do arrendamento, estará, em princípio, dependente da existência de algo mais para além do próprio baldio: tendo por objeto uma unidade económica, pressupõe que ao prédio rústico cujo gozo é transferido para o locatário se encontrasse já afetado um fim determinado e específico, mais concretamente ao de nele vir a ser explorada ou desenvolvida uma certa atividade. Assim, enquanto o arrendamento, por se bastar com a transferência do gozo de determinada coisa imóvel, pode ter por objeto a temporária transmissão de qualquer prédio rústico, ainda que inativo ou aban- donado, a cessão de exploração, justamente por pressupor uma organização concreta de fatores produtivos vinculada à prossecução de um determinado fim com utilidade económica, e mesmo que não tenha por objeto um verdadeiro estabelecimento comercial − o que, em bom rigor, a figura pressuporia − encontrar-se-á confinada aos casos em que o prédio pretendido transmitir se ache provido dos meios materiais indispen- sáveis ao seu aproveitamento económico, designadamente móveis, máquinas, utensílios que tornem viável o arranque da sua exploração, ainda que esta não se tenha ainda efetivamente iniciado (cfr. neste sentido, a propósito da cessão de exploração do estabelecimento comercial, e Miguel J. A. Pupo Correia, Direito Comer- cial , Ediforum, 8.ª edição, p. 329). Por isso, enquanto no arrendamento a transferência do gozo de outros elementos para além do prédio é apenas facultativa – no caso do arrendamento rural, este poderá abranger, por acordo das partes, não apenas o terreno, as águas e a vegetação que constituem o seu objeto típico, mas ainda o conjunto das infraestru- turas, máquinas e equipamentos que se encontrem porventura associados à respetiva exploração –, já na cessão de exploração essa transferência é inerente à própria natureza do contrato: na cessão de exploração, o cedente demite-se temporariamente do exercício da atividade que, através da mobilização daquele conjunto de elementos, vinha sendo exercida sobre o prédio ou através dele para que a mesma possa ser assumida pelo locatário (cfr. Miguel J. A. Pupo Correia, ob. cit. , p. 327). Justamente por assim ser, o cessionário, ao invés do arrendatário, encontra-se obrigado a preservar a utilidade da unidade produtiva que temporariamente lhe foi cedida, não podendo alterar o destino específico que a mesma assuma na economia do respetivo proprietário. Daqui não se segue, todavia, que, no âmbito do arrendamento, o locatário possa afetar o prédio locado ao serviço de qualquer finalidade: em se tratando de arrendamento rural, o arrendatário encontra-se obrigado a respeitar, relativamente ao prédio rústico cedido,

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=