TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015

170 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL IV – O Tribunal tem entendido que o núcleo essencial daquela garantia coincide com o direito de recorrer de decisões condenatórias e de atos judiciais que, durante o processo, tenham como efeito a privação ou a restrição da liberdade ou de outros direitos fundamentais do arguido, mas a identificação das garantias de defesa do arguido, designadamente no âmbito de uma condenação proferida em 2.ª ins- tância, na sequência de absolvição pelo tribunal recorrido, não pode alhear-se do contexto processual em que são convocadas, o que exige, naturalmente, a compreensão de todo o regime que o delimita, tendo o enquadramento normativo do regime de recursos em processo penal e a limitação do acesso aos tribunais superiores conhecido uma evolução significativa desde a aprovação do Código de Pro- cesso Penal atual em 1987. V – A norma objeto de fiscalização foi introduzida pela revisão ao CPP empreendida pela Lei n.º 20/2013 que, prosseguindo o desiderato a que se propusera já em 2007, de restringir o acesso ao Supremo aos casos de “maior merecimento penal” (definidos como aqueles em que tenha sido aplicada, por alguma das instâncias, pena de prisão superior a cinco anos), e respondendo à jurisprudência do Tribunal Constitu- cional, firmada no Acórdão n.º 324/13, modificou a alínea e) do n.º 1 do artigo 400.º, aditando expressa- mente à lista de decisões irrecorríveis, os acórdãos proferidos em recurso pelas Relações que apliquem pena de prisão não superior a cinco anos, ultrapassando o julgamento de inconstitucionalidade desta solução, por violação do princípio da legalidade em matéria criminal, pelo Tribunal Constitucional. VI – Toda a jurisprudência do Tribunal Constitucional, no que respeita à norma do artigo 400.º, n.º 1, alínea e) , do CPP, entronca no Acórdão n.º 49/03, cujos fundamentos têm sido invariavelmente repe- tidos ou simplesmente acolhidos nas decisões subsequentes, mesmo naquelas que tiveram por objeto normas do artigo 400.º, n.º 1, alínea e) , do CPP resultantes de revisões legislativas posteriores. VII – A revisão de 2013, ao adicionar a irrecorribilidade a condenações em penas de prisão efetiva até cin- co anos, reacendeu, a problemática de saber se no quadro legislativo em vigor, em face da evolução sofrida no regime de recursos originariamente desenhado no CPP, a norma que impede o recurso do arguido de acórdão proferido pela Relação que o condena em pena de prisão não superior a cinco anos, na sequência de absolvição em primeira instância, assegura devidamente as suas garantias de defesa em processo penal, nomeadamente o direito ao recurso do arguido. VIII– No Acórdão n.º 49/03 o Tribunal Constitucional concluiu que não desrespeita o artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, a norma da alínea e) do n.º 1 do artigo 400.º do CPP (na redação da Lei n.º 59/98, de 25 de agosto), «por o acórdão da Relação consubstanciar a garantia do duplo grau de jurisdição, tendo em conta que perante ela o arguido tem a possibilidade de expor a sua defesa». A questão que agora se coloca é a de saber se à luz do atual regime de julgamento dos recursos em processo penal ainda é pos- sível considerar que a mera apreciação por dois tribunais de graus distintos assegura suficientemente as garantias de defesa do arguido absolvido em primeira instância e condenado na instância de recurso, de forma a permitir concluir pela não violação do direito ao recurso previsto no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição. IX – A resposta não pode deixar de ser negativa, não sendo possível ignorar na apreciação da norma impug- nada as significativas alterações introduzidas pela revisão do CPP de 2007, que permitem identificar linhas diferenciadoras do regime de recursos em processo penal hoje vigente relativamente à versão do CPP que originou a jurisprudência do Acórdão n.º 49/03, não podendo ser esquecida a substancial ampliação introduzida na margem para a revisão da matéria de facto pela 2.ª instância.

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