TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 94.º Volume \ 2015
171 acórdão n.º 412/15 Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional: I – Relatório 1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que são recorrentes A. e B. e são recorridos o Ministério Público e C., foi interposto recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alí- nea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional [Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (LTC)]. 2. Os ora recorrentes foram absolvidos, em primeira instância, dos crimes de que eram acusados bem como do pedido de indemnização cível contra si deduzido. Interposto recurso pelo assistente e demandante, por acórdão de 28 de janeiro de 2013, o Tribunal da Relação de Lisboa, julgando parcialmente procedente o recurso, decidiu alterar a matéria de facto fixada em 1.ª instância e condenar os arguidos do seguinte modo: X – Acresce que a garantia do duplo grau de jurisdição não elimina o risco de erro judiciário, nem sendo possível afirmar-se que conduz à sua redução em todos os casos; na verdade, se a “dupla conforme” absolutória ou condenatória pode ser encarada como um indício seguro de inexistência de erro de julgamento, e por isso constitui um instrumento legal de limitação à recorribilidade das decisões judi- ciais, o cenário de divergência do sentido decisório afirmado na instância de julgamento e na instância de recurso, que ocorre neste caso, permite legitimar a dúvida sobre a justiça da decisão. XI – Embora a possibilidade de recurso, neste caso, possa levar à assimetria do regime em favor da defesa, na configuração dos graus de recurso em processo penal não deve perder-se de vista que da circunstân- cia de o arguido não poder ter menos direitos do que a acusação, não significa que não possa ter mais. XII – A substituição, pelo legislador de 2007, do critério para aferir a irrecorribilidade da decisão da Relação proferida em recurso baseado na “pena abstratamente aplicável” pelo critério da “pena concretamente aplicada”, para além de tornar irrecorríveis as condenações em pena não privativa da liberdade, intro- duziu imprevisibilidade nos graus de recurso abertos ao julgamento de cada caso, fazendo depender a admissibilidade de recurso, em última análise, da decisão da própria instância que profere a decisão; além disso, ao eleger como critério a pena concretamente aplicada para determinar a irrecorribilidade da decisão condenatória de segunda instância, antecedida de absolvição na primeira instância, o legislador permitiu a sua aplicação à condenação por qualquer crime punível com pena de prisão, inclusivamente aqueles que são puníveis com a mais grave moldura penal abstratamente aplicável; neste quadro, conti- nuar a falar de “crimes de gravidade menos acentuada” como elemento justificador da limitação de acesso ao Supremo Tribunal de Justiça não constituirá, porventura, a melhor análise do problema. XIII – Sendo razoável limitar o acesso ao Supremo Tribunal de Justiça em ordem a prevenir a sua eventual paralisação, tal não deve, todavia, ser alcançado à custa das garantias de defesa do arguido, que é o que acontece neste caso sendo imperioso concluir que a irrecorribilidade da decisão condenatória, em segun- da instância e em revogação da absolvição proferida em primeira instância, viola as garantias de defesa do arguido, em especial o seu direito ao recurso consagrado no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição.
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